Este é o nono de uma série de textos curtos, de uns poucos parágrafos e alguns links, sobre o que pode acontecer, ou se tornar digno de nota, nos próximos meses e poucos anos. Como há uma tradição de, no fim do ano, pensar sobre as possibilidades do ano que vem, o título fala de… 23 anotações sobre 2023. O primeiro texto [Guerra. Eterna?] está no link bit.ly/3B0mysO, o segundo [Inflação. Recessão? E Investimento?] em… bit.ly/3ir4PUR, o terceiro [Energia e Descarbonização] em… bit.ly/3gUdD5w, o quarto [Sociedade & Política], em bit.ly/3FrM50P, o quinto [Pessoas & Costumes] em… bit.ly/3H7CAFb, o sexto [Plataformas & Ecossistemas], em bit.ly/3VEcxK3, o sétimo [Efeitos de Rede, Escala e Sustentabilidade]. em bit.ly/3BjJUK1, o oitavo [O Mundo é Figital], em bit.ly/3FEmMJ2, o décimo, [5G & Internet das Coisas], em bit.ly/3W8yVLC e o décimo primeiro, [Indústria… 4.0?], em bit.ly/3BpZuUK.
Marketing é Estratégia, Figital
Uma indústria é um grupo de empresas relacionadas pelas suas principais atividades de negócios [como a “a indústria automotiva”]. Uma indústria… deve ser vista como uma rede de agentes que satisfazem necessidades das pessoas como clientes [logo, a indústria começa na necessidade]. Marketing… vê todo o processo de negócios como um esforço integrado para descobrir, criar, despertar e satisfazer as necessidades das pessoas como clientes.
Um negócio é seu marketing. E as lógicas dos dois são descobrir, despertar, criar, articular e satisfazer as necessidades dos clientes.
Um negócio… não produz e|ou vende bens e|ou serviços; ele cria e compra clientes; seu principal papel é fazer o que fará as pessoas quererem fazer negócios com ela.
Nos negócios… as competências, habilidades e recursos para “comprar” clientes são criadas pela estratégia. Sem estratégia, marketing é inútil. Com estratégia, marketing é estratégia.
Acabamos de resumir, nos quatro pequenos parágrafos anteriores, um dos textos acadêmicos mais relevantes de todos os tempos [bem mais de 5.000 citações], Marketing Myopia, de Theodore Levitt, publicado na Harvard Business Review há 62 anos [bit.ly/3iNfJEO]. Você nunca ouviu falar ou faz tempo que leu e não se lembra direito? Clique no link aí atrás, tem o artigo na íntegra, aberto. Vá ler. Não só é uma jóia do pensamento acadêmico de qualidade sobre marketing, mas é atual, vale para tudo o que está acontecendo agora, no mundo figital [veja o post anterior desta série em… bit.ly/3FEmMJ2].
Levitt já entendia claramente que marketing era uma das essências da estratégia de qualquer negócio e que o papel do marketing transcendia, em muito, publicidade [a promoção de algum produto e|ou serviço para um público ou comunidade] e propaganda [esforço mais ou menos sistemático de manipulação de ações, visões e|ou crenças das pessoas].
Parte desse entendimento se perdeu com o tempo e quase tudo o que marketing faz, hoje, e no mundo figital [bit.ly/3FEmMJ2], é publicidade. Na maior parte dos casos, analógica, mesmo quando [literalmente] veiculada nas dimensões digital e social do espaço figital: sempre no modo publish and push to the public, sem conexões e relacionamentos, e com banda estreita no retorno, isso quando a possibilidade existe. Uma das causas -e consequências!…- disso é que, hoje, marketing “fica” com o problema de atração e conversão de clientes, [quase] sem participar de tudo o mais que acontece para que a entrega ao cliente possa se dar.
Marketing não surgiu com jornais, rádio e televisão, muito menos com town criers [bit.ly/3uzaH1d]. A citação mais antiga que temos para marketing é…
…as pessoas não são autossuficientes e as sociedades evoluem para satisfazer necessidades humanas. como os indivíduos têm habilidades diferentes, suas vantagens comparativas levam a uma divisão do trabalho, que resulta em maior eficiência na produção. a divisão do trabalho, no entanto, também resulta em uma divisão entre produtores e consumidores… …para preencher tal lacuna, trocas, no mercado –venda e compra– são necessárias. e o processo de troca requer trabalho, o trabalho consome tempo e o tempo tem um custo de oportunidade. isso levou ao surgimento dos intermediários de mercado e seu trabalho –o marketing– cujo papel estrutural, na sociedade, é criar maior eficiência nas trocas de mercado.
O autor do texto e da definição de marketing, acima, é somente Platão, citado por J. M. Cassels, na primeira edição do Journal of Marketing, em 1936 [aqui: bit.ly/3FBQDl6], que marca o início dos debates teóricos sobre marketing, rediscutindo tudo, desde o próprio Platão, e criando as bases para o que seriam os grandes avanços conceituais a partir da década de 1990. Mas isso é assunto para um texto muito mais longo do que esse [que, se eu tiver tempo, vai aparecer em uns meses…].
Antes da gente falar de marketing em 2023 e depois, vale a pena citar uma frase, de um autor e artigo muito influentes: a fronteira empresa / sociedade …está se dissolvendo… e é possível que marketing, como área funcional distinta dentro da empresa, esteja se tornando obsoleto. Dito por ninguém menos que Rashi Glazer, no mesmo Journal of Marketing, em 1991 [bit.ly/3h9w6eu], quando ainda não havia nem internet, nem smartphones, ou apps, plataformas, redes sociais, ecossistemas, nuvem, games, 5G, IoT, streams, SaaS, SEO, RTB… nada.
De lá pra cá, o espaço de performances se tornou figital, onde tudo são fluxos de Castells [veja O Mundo é Figital, nesta série… bit.ly/3FEmMJ2], e os negócios ou são plataformas que habilitam ecossistemas ou fazem parte de ecossistemas habilitados por plataformas de terceiros.
Aí… tudo passa a ser coopetição [cooperação ao mesmo tempo que competição, entre todos os agentes de um ecossistema, e até entre ecossistemas] em rede, e onde marketing figital é um… processo adaptativo e habilitado por tecnologia em que empresas colaboram em redes [com clientes, usuários, fornecedores, parceiros… líderes…] para criar, comunicar, entregar, capturar… e sustentar valor, em conjunto, para todas as partes [de P. K. Kannan e Hongshuang Li, em Digital Marketing: A framework, review and research agenda, International Journal of Research in Marketing, 2017, no link bit.ly/3VZKipD, com o figital por nossa conta].
Esta definição resolve -de uma vez por todas?…- o grande debate do marketing nos últimos [pelo menos] dez anos: qual é o papel do marketing nas organizações e onde ele fica na arquitetura do negócio? Como marketing -no mundo em rede, figital– trata de todo o ciclo de vida de valor no negócio, de criação a sustentação, marketing está disperso na organização, em todas as suas facetas, processos e funções, assim como inovação.
Aliás, como todos os negócios, no mundo figital, são ecossistemas habilitados por plataformas [ou parte de um deles, como agentes potencialmente independentes]… um ecossistema de negócios pode ser definido como um ecossistema de inovação associado a um ecossistema de marketing, ligando a ideia de Peter Drucker de que um negócio só tem duas funções essenciais [inovação e marketing] à de Kelly Hewett e outros [em Cross-border marketing ecosystem orchestration, IJRM, 2022, bit.ly/3uzXrJR]. que elevam as funções a ecossistemas. Um ecossistema de inovação é… um arranjo colaborativo através do qual empresas [parte do ecossistema] combinam suas ofertas para criar soluções coerentes e voltadas para os clientes e consumidores. Um ecossistema de marketing é um… conjunto conectado, interdependente e coevoluindo de instituições, atores e atividades que habilita a criação, comunicação, troca e entrega de soluções de valor para clientes, consumidores, parceiros, economia e sociedade em geral.
O resumo da ópera? Pequenos debates sobre marketing não vão resolver seu problema de marketing. Entre estes pequenos embates, pode-se perguntar se marketing é arte ou ciência [bit.ly/3iOQwdd], racional ou emocional [bit.ly/3Fj538e]; se é apenas atividades de comunicação [bit.ly/3PguPi0] e se marketing de conteúdo faz sentido [bit.ly/3ULRfcn] ou já morreu [bit.ly/3VX3EeE]. Ou quais são as chaves do crescimento liderado por marketing [e o trabalho dos CGOs… bit.ly/3BpHLwC; este link leva ao estudo da imagem acima].
Mas já havia um grande debate -há 20 anos e mais- sobre se marketing, como um todo, ainda serve pra alguma coisa… ou não. A decisão, por voto? 48% a 52%… imagine pra que lados [antes de clicar em bit.ly/3W2eyQ7]. Minha conclusão é que marketing continua fundamental. Mas não o marketing “da” ou “centrado na” teoria da comunicação de Harold Lasswell [que nos deu os “canais”, bit.ly/3uyU06d] e muito menos o marketing das “mídias” de Marshall McLuhan [bit.ly/3FHeG2h], ainda menos com o aposto “sociais” de Darrell Berry [bit.ly/3BmRWBM]. O marketing que vai existir cada vez mais intensamente em 2023 e depois é figital e trata, como ecossistema e articulado ao ecossistema de inovação, dos fluxos de Castells. Por isso é que…
…É preciso repensar os fundamentos do marketing, agora como ecossistema, levando em conta que negócios são ecossistemas que coopetem no espaço figital.
E, repito: não é só ter alguma estratégia para marketing, como ele é -aliás, era, há algum tempo…-, ou descobrir como investir e medir o retorno do investimento em “marketing digital”, como se as dimensões digital e social do espaço figital fossem só uns “canais a mais”. Não são. Mas são, na verdade, parte de uma transformação que redefine, de uma vez por todas, o espaço competitivo. É repensar o que é marketing, no negócio e seu ecossistema, em função das [re]definições deste texto, com implicações profundas na [re]definição do negócio e suas relações com suas redes de valor.