o texto abaixo foi publicado no DIÁRIO DE PENAMBUCO, que ainda é o jornal mais antigo em circulação na américa latina, em 28 de julho de 1999. foi escrito por causa de um número de experiências que incluiu um bate e volta do recife a genebra, apenas pra apresentar um projeto “ao vivo” na organização mundial da saúde, uma das exigências de uma competição para reverter o avanço global da malária, na época.
quem me relembrou a coisa toda foi roberta rêgo, que estava fotografando seus arquivos analógicos e mandou a foto da página do DP que está no fim do texto, histórica até porque tem um resumo da FENASOFT de 1999. bons e divertidos tempos. heróicos, até, quando a gente fazia o RADIX no recife [e roberta estava lá]. tempus fugit. mas aí tem um monte de coisas que a gente está vivendo hoje… e que ainda não está, como cada time jogando no seu campo, com bolas de realidade aumenta que atenderiam, hoje, por um nome que nem havia na época: gêmeas figitais. chegaremos lá?
certas horas, parece que karl valentin tinha razão e o futuro era melhor no passado. mas a esperança nos diz que é preciso perseverar. simbora.
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Mal o comandante do Airbus “João XXI” desligou a proibição de fumo a bordo, dezenas de pessoas, literalmente, acenderam seus cigarros. Não havendo lugar em nenhuma outra parte do avião, estava junto com os “fumadores”. Eram os primeiros minutos de longas 9 horas de vôo (ida), gastas para participar de uma reunião de 2 horas em Genebra, Suíça. Não que a Suíça e Genebra não sejam lugares para ir: certas horas, até parecem virtuais, de tão belas, organizadas e calmas. Mas por que ir até Genebra para uma reunião de duas horas, quando não se tem tempo para mais nada, a não ser pegar outro avião de volta?
Parece que estamos, ainda, na idade média das comunicações. Aliás, não parece, estamos. No futuro, nosso tempo será conhecido como o “fim da revolução industrial”, quando as pessoas ainda tinham que viajar horas ou dias para interagir com outras. Ainda bem que a reunião era em Genebra e não em Seul ou Cingapura, pra onde foram alguns colegas um dia destes. Aí é danado mesmo. Tomara que o vôo tenha sido não-fumante.
Mas quais são as alternativas a não ir? Chat? Não dá nem pra começar. Vídeo conferência pela Internet? Muito ruim, ainda. É só tentar algo como CU-SeeMe (cu-seeme.cornell.edu – link original substituído pela história do sistema, na wikipedia; imagem de uma tela da época mostrada a seguir) que apesar de interessante para conversar com amigos distantes, é completamente inútil para realizar uma apresentação de qualidade, especialmente se você quiser realmente ver as expressões dos rostos da audiência enquanto você fala sobre sua proposta. Poderia listar software após software para trabalho em grupo e realidade virtual, alguns dos quais têm defensores cuja lealdade e ferocidade deixam guerrilheiros religiosos morrendo de inveja. Mas não vou.
A verdade, mesmo, é que o único substituto para uma reunião real, séria, onde vai ser discutido o futuro da humanidade (no caso, talvez o meu ou o seu) ou um monte de dinheiro (quem dera fosse nosso) é uma reunião virtual igualzinha. Dessas de ficção científica, onde cada pessoa na “sala virtual” vê, ouve e, talvez, sente o que as outras pessoas estão sentindo e que possa até ser melhorada, localmente, com o software e hardware que cada um tenha à sua disposição. E não sensivelmente piorada, como é atualmente o caso.
O som, nas reuniões virtuais de hoje, falha vez por outra e nem tem essa qualidade toda. A imagem falha sempre e é, para ser honesto, uma porcaria. Não estou falando de reuniões usando circuitos de centenas de megabit por segundo, mais caros do que o custo de deslocamento dos participantes. Me refiro à rede real que nós usamos. Aqui ou nos EUA, não há capacidade e capilaridade, na rede, para se fazer algo decente. Talvez haja na Internet 3, da qual a versão 2 (www.internet2.edu – o link aponta para o que é o esforço hoje; à época, prometia ver a ser muito mais do que a internet é hoje) vai ser só um ensaio. Vou esperar pra ver.
Mesmo que som e imagem saiam e cheguem como deveriam, com qualidade de televisão digital, não quero só isso: som e imagem na tela são uma imitação muito pobre da minha reunião em Genebra, pois encapsulam e restringem o ambiente em um plano e tiram toda a beleza e significado dos processos de interação que ocorrem quando estamos frente a frente, olho a olho com os outros participantes.
O ambiente de reuniões virtuais de que precisamos, e que quando tivermos vamos usar mesmo, tem que nos dar a ilusão-quase-certeza de que realmente estamos lá. E os outros cá. Projeções tridimensionais de qualidade, com dispositivos de interação que nos façam sentir, ao apertar a mão de uma imagem, a força do aperto de mão do personagem que, do outro lado do mundo, aperta nossa mão virtual. Aí sim, não vamos mais viajar muito a trabalho.
Até lá, não vai dar para atender ao apelo do título, tirado de um anúncio do serviço de teleconferências de uma das operadoras da Europa. Mas, quando tivermos o “meu” ambiente de reuniões virtuais, muitas das coisas que fazemos hoje, na rua, poderiam ser feitas em casa. Ou sem ir tão longe. Até o futebol poderia mudar: cada time, real no seu gramado, seria virtual em outro. A torcida, em casa, seria virtual nos dois estádios. Já pensou?… E a bola?… E a emoção? Esperar pra ver…
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só pra constar, o CESAR.org.br só tinha três anos em 1999 e ficou entre os dois finalistas mundiais para prover a infraestrutura de informação para o projeto de conter a malária liderado pela OMS. malária ainda é um mega problema global e a falta de articulação dos países ao redor de objetivos comuns sabota a aspiração de quase zerar os casos de malária até 2030. o número de casos parou de cair [estamos acima de 228 milhões por ano] e o número de mortes está ao redor de 400.000 anualmente. em números humanos, malária mata mais de 1.000 pessoas todo dia. é lasca.