a 6ª câmara cível do tribunal de justiça do rio condenou google a pagar R$10K a uma pessoa que se sentiu ofendida por comentários feitos em uma das comunidades da rede social orkut. a defesa de google alegou que… ” o usuário é autor do perfil de sua página do orkut; ele é também quem controla qualquer informação inserida por ele próprio ou por terceiros; que seria impossível fazer o monitoramento, controle e bloqueio prévios de inserção de conteúdo e que ainda não há legislação que obrigue os provedores a exercer o controle do conteúdo inserido na internet”… mas não rolou. a justiça do rio manteve a sentença e, espera-se, a companhia vai recorrer até o supremo.
em casos anteriores [e antigos, de 2005] a polícia chegou nos culpados e eles foram presos; é difícil entender porque, na situação atual, o julgado é a ferramenta e não o ato cometido. se google perder na instância final, quais serão as conseqüências? na web, muitas e radicais. neste blog, por exemplo, o terra poderá ser processado porque alguém [anonimamente] “ofendeu” um outro alguém, nos nossos comentários. no mundo físico, a tramontina será processada porque, ao fabricar facas, criou as condições para que alguém matasse um desafeto. e há as fábricas de ferramentas, automóveis… e tudo o que puder ser usado como meio para agredir alguém [anonimamente]. e o correio, em última análise, terá que responder por todas as cartas anônimas que rolam pelo brasil afora, talvez muitos milhares por dia.
alternativas? muitas. entender melhor o que é a web é uma delas, certamente a principal. os limites e possibilidades atuais da web são muitos e uma pá de coisas não é viável na prática. identificar, de forma irrecorrível, um usuário [da rede] é uma delas. tal dificuldade é quem cria, por sinal, o “problema” lá do orkut [ou aqui no blog], pelo qual google, o dono da rede social, foi condenado. e que pode ser generalizado pra todo lugar, na web, onde seja possível escrever algo sem identificação positiva.
pra complicar, poder-se ia perguntar: e nós, homens e mulheres, queremos viver num mundo onde a via da identificação perfeita possa se transformar em controle total? queremos que todo mundo que comente, escreva, publique seja inequivocamente identificado? que tipo de mundo seria este? matrix? que tal ouvir neo e morpheus?
[morpheus:] a matrix está em todo lugar. à nossa volta. mesmo agora, nesta sala. você pode vê-la quando olha pela janela ou quando liga sua televisão. você a sente quando vai para o trabalho, quando vai à igreja, quando paga seus impostos. é o mundo que foi colocado diante de seus olhos para que você não visse a verdade. [neo:] que verdade? [morpheus:] que você é um escravo. como todo mundo, você nasceu num cativeiro, nasceu numa prisão que não consegue sentir ou tocar. uma prisão para sua mente.” provavelmente com um endereço ip, móvel, certificado, pra cada mente.
o problema de segurança on-line não é trivial. ainda mais porque estamos em tempos em que o hardware e software da rede redefinem uma parte cada vez maior da nossa cultura em termos de cultware, uma cultura digital, popular, on-line, onde as fronteiras são irrelevantes na maior parte dos casos. no novo mundo de cultware, ainda não temos as interpretações e entendimentos necessários para separar ações, atores e meios. resultado? acabamos condenando o lápis e o papel pelo que o bobo da corte -certo ou errado- escreveu.
este problema não é novo. a tecnologia, domínio das possibilidades, sai na frente. o entendimento, vindo das ciências humanas, precisa de experiência e reflexão e, necessariamente, segue o líder, muito tempo depois. aconteceu antes, vai continuar acontecendo. mas como o mundo -em modo beta- gira cada vez mais rápido, podemos ao menos ter a esperança de que o judiciário, à medida em que passe a viver na sociedade da informação, entenda muito mais -e na prática- o que está acontecendo aqui na rede. e que isso leve a melhores decisões sobre os assuntos em que a rede tenha um papel preponderante… ou seja, daqui a algum tempo, todos.