Redes. Pessoas, do mundo inteiro, colaborando. Dados, de milhares de laboratórios, hospitais, centros de pesquisa e sistemas de saúde, online, abertos, analisados por sistemas escritos em conjunto, por gente de todo o mundo. Dezenas de esforços simultâneos, fertilizados uns pelos acertos e erros dos outros, e muitas vacinas prontas, em tempo recorde, para enfrentar uma das maiores ameaças à vida humana na Terra em séculos.
Para distribuir a vacina e imunizar pessoas, pelo mundo, redes. Redes de produção, distribuição armazenamento em condições especiais, aplicação em contextos múltiplos, estratégias idem, para maximizar o impacto da solução, diminuir riscos, proteger as pessoas e a acelerar a recuperação das economias. Nunca, aliás, houve qualquer conflito entre proteger as pessoas e manter a economia funcionando. As pessoas e a economia são a mesma rede. Tudo são redes.
Em rede, os agentes precisam conhecer e reconhecer uns aos outros, para que estratégias -em rede- possam ser desenhadas e executadas. A rede deveria ser uma só no planeta, porque o planeta deveria ser uma só rede, de humanos diversos, de lugares muitos, mas todos gente, terráqueos. Em rede, deveríamos nos articular todos, para o bem comum, porque o comum, a comunidade, deveria ser a única coisa que interessaria a todos. Em rede, deveríamos trabalhar juntos para resolver os problemas que nos afetam a todos. Como é que tantos de nós usam a rede para se articular uns contra os outros?… Ah, a humanidade, e sua diversidade, parte dela interessada na destruição e subjugação do outro, e não na composição com ele.
A humanidade, como sistema, não tem um antivírus. Os sistemas computacionais -aparentemente- teriam resolvido esse problema há algum tempo. Mas não: os antivírus de computador só reconhecem vírus que já causaram impacto pelo menos uma vez; aí, o código para identificá-los passa a fazer parte do antivírus e segue a vida. Algo muito parecido acontece com os vírus biológicos, até porque, da mesma forma que no universo computacional digital, não há como, hoje, mapear todas as ameaças virais e vacinarmo-nos contra todas.
E isso quer dizer que a grande rede dos bilhões de humanos, mesmo com toda a fragmentação dos últimos anos, terá que, em conjunto -todos nós, juntos- enfrentar desafios que, como os vírus e a crise climática, não respeitam fronteiras geográficas nem ideológicas. E tampouco pedem licença para quem quer que seja. A rede, digital, global, foi um dos sustentáculos do esforço da humanidade para ter vacinas em tão pouco tempo. O digital, em rede, tem os dados que todos poderíamos usar para interpretar as experiências e os fatos que nos cercam, para tomar decisões e criar táticas e operações baseadas em evidências e não em suposições.
A menos que haja alguma surpresa escondida em teorias que ainda não temos, o Universo levou 13,8 bilhões de anos para chegarmos até aqui e talvez ainda haja alguns billhões de décadas pela frente. Mas é quase certo que, um dia, não haverá -neste universo- mais condições para a vida como a entendemos. Esta impermanência fundamental deveria nos fazer, como humanidade e com humildade, aproveitar a vida que ainda temos, daqui até o grande ajuste de contas, como humanos. Como gente. Verdadeiramente interessados na vida de todos nós e de todo o ecossistema que faz parte da nossa grande rede. Inclusive os vírus, que não estão aí por acaso.
O acaso, na rede, talvez sejamos nós, os humanos. Mas não é um acaso quando colaboramos porque, para isso, e em problemas complexos, sempre é preciso criar políticas e estratégias que transformam aspirações em capacidades. Foi isso que 2020 nos mostrou. Que frente a ameaças que podem comprometer todo o futuro da humanidade, a nossa rede se articula, reage, responde e resolve. Em que pese uns tantos que semeiam a discórdia e tentam atrapalhar a vasta maioria que age humanística e humanitariamente. Tomara que vejamos muito mais humanidade, em rede, em saúde e paz, em 2021. Até lá.