não faz muito tempo que este blog comentou sobre o embate entre as teles e a ANATEL sobre o que é e como medir banda larga no brasil. o texto, que por tão perto do carnaval tinha por título cadê a banda?…, dizia que…
…do ponto de vista da cobertura e qualidade da banda larga móvel, esta década vai ser muito desafiadora em todo mundo. a conversa de que precisamos fazer algo melhor "pra copa" e "olimpíada" é bobagem: temos que ter mais e melhor banda larga [móvel e fixa] porque a sociedade toda precisa dela, porque se trata de uma das infraestruturas essenciais para tudo, como eletricidade, água e esgoto. de pouco adianta ficar discutindo um ou outro regulamento da anatel. pois isso não vai resolver o problema de fundo, que é o de ampliar –muito!- a cobertura nacional de 3G+ e a base de acessos fixos e cuidar para que o que se vende seja entregue.
e mais:
se seu plano de 15 mega diz que não há nenhuma garantia de entrega, é isso que você está comprando. e é uma grande oportunidade de mercado para outra operadora que entregue, digamos, a metade. "meus" 15 mega costumam "entregar" entre 6 e 8 mega no horário de pico. mas tenho várias alternativas de provedor e troquei quando o anterior não entregava nem 20% da velocidade nominal. danado é onde não há alternativa. ou onde o sistema falhou, onde não há política para o setor, nem políticas públicas, tampouco uma visão de mercado de longo prazo.
e dizia, sobre a refrega entre regulador e operadoras, que…
…quando a agência reguladora e as operadoras resolvem atacar um problema de fundo discutindo a equação que deve ser usada para medir a qualidade do serviço, e não o serviço em si… ficam todas as operadoras no mesmo bloco… e nós, no nosso bloco –sem banda- não vamos brincar o carnaval da conectividade.
a discussão evoluiu nos últimos dias. o convergência digital reporta que o sindiTeleBrasil [sindicato que representa as teles] vai escolher até o dia 29 uma "entidade aferidora da qualidade da banda larga", num processo em que cinco entidades apresentaram propostas. até aí tudo [quase] bem.
"quase"? sim, porque o conselho da ANATEL delegou ao sindiTeleBrasil o poder de contratar o órgão aferidor da banda larga nacional. alguns diriam que é o mesmo que contratar a raposa para tomar conta do galinheiro. mas os processos de contratação do governo, órgãos reguladores e estatais são tão complicados que transferir a contratação do aferidor para a iniciativa privada certamente foi um ato de boa fé das partes, até pra coisa funcionar. pelo menos no contexto atual.
mas… [sempre há um mas na vida do brasileiro] uma das empresas que está competindo para ser a "entidade aferidora da qualidade da banda larga" é a ABR telecom, empresa em cujo conselho de serviços figuram apenas representantes das teles. segundo o IDEC [neste link do teletime], a ABR tem que ser excluída do processo de escolha do aferidor, pois é uma "associação constituída por prestadoras de serviços de telecomunicações, em especial as prestadoras do Serviço Móvel Pessoal (SMP) e do Serviço Telefônico Fixo Comutado (STFC)" e a "sua permanência no processo seletivo compromete a própria capacidade decisória da Comissão de Seleção, composta praticamente pelas mesmas empresas que constituem a associação candidata".
a ABR, criada para prover o serviço de roaming no brasil, também está por trás do serviço de portabilidade numérica, além de tratar problemas de fraude comuns a todas as teles. até aí, muito bem: é como se a associação fosse um "operador nacional do sistema" [para telecom], como o ONS o é para o sistema elétrico do país. o ONS, instituição privada e sem fins lucrativos, é fiscalizado pela ANEEL [o regulador do setor elétrico] e seu conselho tem representantes da produção, transporte e consumo, bem como do governo.
o problema –como já se apontou muitas vezes, inclusive na discussão sobre qualidade de banda aqui no blog- não é só pontual, aqui e ali, no cenário brasileiro de comunicação e conectividade.
é que a transformação do setor estatal de telecomunicações para um mercado regulado parou alguns degraus [ou escadarias] antes de ter atingido um estado de coisas equilibrado e sustentável. tivesse a ABR o formato do ONS, claro que poderia –e talvez até devesse- fiscalizar a banda larga. como associação "das teles" não deveria nem ter pensado em entrar no certame –que não é para "fornecer um serviço a mais"-, para não levantar a onda de perguntas e dúvidas em que agora estamos navegando.