estava eu conversando com pessoas muito bem informadas em evento de muito prestígio quando as eleições de 2010 vieram à tona. quieto estava, quieto fiquei, a discussão era sobre candidatos e opções para o futuro do país.
mas não demorou muito até que saísse um “as eleições brasileiras são as melhores do mundo”. como ando escrevendo sobre isso aqui há anos [veja o texto anterior aqui, da semana passada, explicando porque a OAB nacional não assinou digitalmente o software das eleições 2010], tive que dizer algo e disse, em largas palavras, o que tem sido publicado por aqui, sustentado não por minha particular expertise no assunto eleições eletrônicas, que é baixa, mas por sólidos argumentos que vêm do CMIND, o comitê multidisciplinar independente que estuda o processo eleitoral brasileiro. aliás, comentei este assunto em um podcast recente da CBN que você pode ouvir clicando neste link.
e a conversa rolou, rolou, e eu mencionei as eleições de alagoas em 2006… e não é que ninguém sabia de nada sobre o assunto? mas nada, nada mesmo. pessoas lidas, conectadas, que nunca haviam ouvido nada sobre o assunto.
talvez este seja também o caso do leitor, e talvez valha a pena, se for, ler um pequeno e muito instrutivo texto da advogada maria aparecida cortiz [que é membro do CMIND], publicado no portal unieducar há mais ou menos um mês.
o título do artigo é Princípio do contraditório e da imparcialidade no processo eletrônico de votação e doutora cortiz foi uma das pessoas que estudou de perto o caso “alagoas 2006”, que resumidamente… teve início em 11/2006 após ser detectado que os arquivos de LOG de 35% das urnas estavam corrompidos e não apontavam o destino de 22.000 (vinte e dois mil) votos dados pelos eleitores, além de arquivos com dados misturados e urnas computando votos para municípios inexistentes.
isso mesmo que você leu: as “melhores eleições do mundo” não foram tão boas assim [pelo menos] nas eleições de 2006 em alagoas e o destino de dezenas de milhares de votos ficou “no ar”. podem até ter sido dados para alguém, mas não se sabe se foram. e havia “municípios-fantasma”, uma inovação eleitoral indesejada, pois no passado eram somente os eleitores-fantasma que preocupavam.
a decisão do TSE sobre o assunto também é desconhecida das pessoas lidas e conectadas de que falo: o tribunal decidiu que mesmo havendo graves indícios de que alguma coisa está errada, tudo está certo.
aliás, como de praxe, o tribunal julga ele mesmo neste tipo caso e resolveu que não há com que se preocupar, pois… o fato do LOG não registrar um evento não significa que o evento não ocorreu. donde se conclui, usando lógica elementar, que “logs” [arquivos de registro de eventos ocorridos] são inúteis. de que adianta [para verificação de ocorrência de um evento…] um registro que não necessariamente registra a ocorrência de certos eventos, mesmo tendo os dito cujos acontecido?…
mais hora, menos hora, alguma coisa vai mudar; não vai ser possível sustentar por muito mais tempo este estado de coisas. mas o “público”, inclusive o que comenta textos como este aqui no blog, acha que “se as urnas são frágeis, porque a grande imprensa nunca diz nada sobre isso?”…
pergunte-se à grande imprensa. está cheio de gente, lá, que sabe muito bem que a eleição eletrônica brasileira não tem independência de poderes e, por isso, nenhuma chance de ter uma auditoria independente do processo e de seus resultados. se houver uma fraude, dificilmente ela será detectada, como até hoje não se sabe ao certo se “alagoas 2006” foi uma conjuntura de erros de sistema [há erros épicos de software das melhores famílias, como a NASA…] ou se havia cérebros e mão humanas mal intencionados por trás dos muitos eventos não esperados que rolaram por lá.
tomara que a tal da grande imprensa não tenha que mudar de posição e publicar algo apenas por causa de alguma catástrofe que está para acontecer… quando?…
leia, a seguir, trecho do artigo que você pode ver na íntegra clicando na imagem acima:
…O modelo brasileiro faz da Justiça Eleitoral uma fração especializada do Poder Judiciário (CE, CF/88 art. 92, V, 118 a 121), com absoluta concentração das três funções de Estado no mesmo ente. A junção dos artigos 61 da Constituição de 1988 com o artigo 1º do Código Eleitoral tornam o TSE no único órgão integrante da Justiça Brasileira que detém funções legislativa, normativa, administrativa/operacional e jurisdicional do processo eleitoral.
Essa indesejada concentração de poderes permite que os integrantes da Justiça Eleitoral mesmo legalmente impedidos possam julgar causas que versem sobre processo eletrônico de votação, visto que são partes e interessados no desfecho da lide, já que no exercício da função administrativa desenvolvem os programas das eleições e são responsáveis pela sua segurança e bom funcionamento.
As consequências malévolas dessa concentração de funções puderam ser comprovadas no julgamento realizado pelo TSE no dia 08/04/2010 envolvendo pedido de perícia nos programas usados nas eleições Estaduais de 2006 no Estado de Alagoas…
PS: em conversa via emeio com a doutora cortiz na noite passada, ela fez saber a este blog que os programas [perfeitos, como se sabe…] do sistema eleitoral brasileiro, que aliás não foram assinados pela OAB nacional dia 02/09 passado… apresentaram defeitos [surpreendente… não?] e estão sendo assinados novamente, sem grande divulgação [como manchete no jornal nacional, na primeira vez] começando ontem [13/09] e terminando hoje, sem qualquer supervisão externa, certamente porque, perfeitos que são, ninguém precisa se preocupar… é só votar e esperar que não tenhamos nenhum "brasil 2010".