A eleição eletrônica brasileira, sucesso de [certa] crítica e [muito] público aqui, não é exatamente uma unanimidade entre os especialistas. em abril passado, num fórum nacional de segurança em urnas eletrônicas no instituto de ciências matemáticas e de computação da USP/são carlos, concluiu-se mais uma vez que as urnas eletrônicas brasileiras são menos seguras do que se anuncia. o fórum publicou um memorando de apoio à lei 12.034/2009 que, se cumprida, levaria à mudança nas urnas na eleição de 2014, possibilitando a conferência do registro do voto pelo eleitor e fiscais [este é o princípio da publicidade do processo eleitoral] e tornando o processo de votação independente do software, o que não é o caso nas urnas nacionais.
o brasil é o único que ainda usa urnas eletrônicas de primeira geração, que foram testadas e abandonadas por [entre outros ] índia, argentina, paraguai, venezuela, equador, méxico, rússia… e por aí vai. leia o memorando de são carlos aqui.
a lei 12.034/2009 não está valendo na íntegra porque seu artigo 5º foi suspenso em 2011, por decisão cautelar do STF na ação direta de inconstitucionalidade 4543, que parece ter sido gerada dentro do próprio TSE.
a suspensão do art. 5º da lei 12.034/2009 suspendeu, claro, seu § 5º, onde se dava ao TSE a permissão para identificar o eleitor através de dados biométricos desde que o sistema de identificação não tivesse conexão com a urna eletrônica [o que, parece, não será o caso em 2014]. isso tem um efeito colateral, por causa de um outro art. 5º, de outra lei, a 7.444/85: conversamos com amílcar brunazo filho, especialista em eleições eletrônicas, que nos contou o seguinte [ipsis litteris, negritos do blog]:
“O processamento eletrônico de dados do alistamento eleitoral é regulado tão somente pela lei 7.444/85, que diz explicitamente que:
Art. 5º…
§ 1º O Escrivão, o funcionário ou o Preparador, recebendo o formulário e os documentos, datará o requerimento e determinará que o alistando nele aponha sua assinatura, ou, se não souber assinar, a impressão digital de seu polegar direito, atestando, a seguir, terem sido a assinatura ou a impressão digital lançadas na sua presença.
….
§ 4o Para o alistamento na forma deste artigo, é dispensada a apresentação de fotografia do alistando.
Ou seja, a lei somente permite ao administrador eleitoral exigir a impressão digital do polegar direito se o eleitor não souber assinar.
Ademais, o eleitor é dispensado de fornecer sua fotografia.”
e amílcar diz mais:
“Como se não bastasse, a administração do cadastro eleitoral eletrônico deveria ser de uso exclusivo do administrador eleitoral:
Lei 7.444/85:
Art. 9o O Tribunal Superior Eleitoral baixará as instruções necessárias à execução desta Lei, especialmente, para definir:
I – a administração e a utilização dos cadastros eleitorais em computador, exclusivamente, pela Justiça Eleitoral;
Portanto, é totalmente ilegal o compartilhamento dos dados biométricos dos eleitores que o TSE recolhe com qualquer outro órgão governamental (como Ministério da Justiça ou Polícia Federal), como ele vem fazendo.”
amílcar brunazo filho conclui dizendo que…
“Assim, a coleta das impressões digitais dos 10 dedos e da fotografia em alta definição tem sido exigidas pelo TSE sem nenhum respaldo legal, a não ser uma casuística interpretação da lei feita pelos próprios administradores do TSE, que também vestem a toga de juízes do STF.
Não há absolutamente nada –ou seja, nenhuma lei- que torne obrigatório o eleitor só exercer seu direito ao voto se fornecer dados biométricos completos ao TSE, e a lei que existe impede o TSE de fornecer esses dados à PF ou ao MJ.
Em resumo, o TSE pode fazer um recadastramento eleitoral obrigatório, mas não poderia exigir os dados biométricos que tem exigido e nem poderia impedir de votar quem não fornecer o que não é obrigatório por lei.”
resumo da ópera? o recadastramento “biométrico”, parece não ter fundamento legal, pois o artigo da lei que autorizaria tal procedimento, e mesmo assim sob certas condições, está suspenso desde 2011… e sem qualquer prazo para ser reavaliado, pelo visto.
e daí?… o eleitor pode ser obrigado a se recadastrar, isso é certo e está rolando. ao chegar para tal, cumprirá um rito que não lhe poderia ser exigido, pois não há nada que o obrigue. sem se recadastrar, lhe será dito que não poderá votar, mas cadê a lei que diz isso? está suspensa, justamente na parte que diz isso. e aí?… alguém vai fazer alguma coisa para julgar a ADI de vez? se a ADI cair, muda a urna eletrônica e teremos uma votação mais confiável. se não, fica como está e o recadastramento é ilegal. e a eleição, tão insegura como todas as anteriores. se quiser mais detalhes, leia este, este e este links. e lute por uma eleição mais segura, também.