o swedish medical nanoscience center, no karolinska institutet acaba de anunciar que conseguiu produzir um neurônio artificial que tem as mesmas funcionalidades de um neurônio natural [que poderia, não por mero acaso, ser um neurônio humano]. a reportagem sobre o artigo científico está neste link.
em se tratando de um trabalho original e, em particular, a primeira versão operacional de tal sistema, ainda há muito o que fazer. um dos primeiros objetivos dos cientistas envolvidos é conseguir miniaturizar o dispositivo para tornar possível a implantação [de um conjunto deles] em humanos. imagine as consequências, do ponto de vista de condições cerebrais para as quais ainda não há qualquer expectativa de tratamento -muito menos cura.
como mostra o diagrama acima, o neurônio artificial [baseado em um polímero orgânico bioeletrônico] pode capturar sinais químicos e transmitir sinais elétricos e iônicos… o mesmo que um neurônio de verdade pode fazer. os envolvidos na pesquisa, parte de uma escola de medicina, fazem planos para aplicar a tecnologia em humanos, como mostra o vídeo no fim desse texto.
mas imagine um outro problema: “fazer” um cérebro artificial é um debate antigo, que envolve múltiplas áreas da ciência e, não menos intensamente, um debate sobre os limites filosóficos e práticos do que se pode fazer em e com ciência. se for possível fazer um cérebro artificial equivalente ao nosso, os engenheiros eletrônicos já trabalham no assunto há mais de cinquenta anos, como você pode ver aqui, e ainda não desistiram de fazer um cérebro artificial com o que se pode chamar de neuristors [veja aqui]. há quem queira fazer um cérebro como o nosso usando emulação, ou seja, combinando hardware e software clássicos [como o que roda no seu celular] para criar um sistema que se comporte como um cérebro. claro que há um debate sobre se este caminho vai ou não levar a cérebros artificiais como os nossos.
mas… e se o caminho descoberto pelo karolinska institutet for escalável? um cérebro humano tem 86 bilhões de neurônios, segundo a melhor estimativa [veja aqui]. há chips com mais de 100 bilhões de transistores, mas sua arquitetura é muito mais simples do que a do cérebro, que pode ter até 100 trilhões de conexões entre os neurônios. esta é uma das redes mais complexas que se pode imaginar, e há vários projetos trabalhando para mapear os links entre os neurônios de nossos cérebros. pode até ser que se chegue a sistemas neuronais que têm por base o protótipo do karolisnka e bilhões de componentes… mas é difícil imaginar trilhões de conexões nos mesmos sistemas.
a menos que…: “desenhar” uma rede de neurônios artificiais é problema antigo e já se sabe, há muito, que é muito mais complexo do que desenhar neurônios. faz tempo que se estuda como usar algoritmos genéticos [métodos de resolver problemas que “imitam” o processo evolutivo, pra você que não é de computação…] para resolver a arquitetura da rede [suas conexões]. e há resultados recentes vindos de todo mundo, inclusive do irã e grécia, mas nada, por enquanto, que nos deixe antever que será possível 1. implementar uma rede de 86 bilhões de neurônios num espaço razoável [que tal o tamanho do cérebro humano?], utilizando uma quantidade razoável de energia e 2. estabelecer as 100 trilhões de conexões que fariam a rede funcionar como algo parecido a um cérebro humano.
aí entra a lei de amara: nós tendemos a superestimar os efeitos de uma tecnologia no curto prazo e a subestimar os mesmos efeitos no longo prazo. se não há nenhum impedimento fundamental, quer teórico ou de engenharia, que estabeleça a impossibilidade de construir um sistema da complexidade de um cérebro humano…. só falta descobrir como. especialmente quando se descobrir como fazer uma rede de neurônios [alguns milhares ou milhões deles…] evoluir para uma outra, de bilhões de neurônios e trilhões de conexões. gerando todo tipo de pergunta interessante para ser respondida pelas próximas gerações, como…: será que o menor [sob vários aspectos] sistema capaz de se comportar como o cérebro humano é do mesmo tamanho e complexidade de um … cérebro humano? parece uma pergunta óbvia, de resposta óbvia, mas não é. pense…
o passo do karolinska institutet é só mais um na longa caminhada em direção a um cérebro artificial. ao mesmo tempo, é um grande movimento, pois descortina toda uma nova área de pesquisa, que pode levar a resultados de curto prazo para quem tem certas condições cerebrais e, no longo [pense muitas, muitas décadas mesmo], pode resolver um dos maiores problemas da computação de todos os tempos.