brenda amaral [do blog do iba] fez três entrevistas, uma comigo e outras com raphael montes e vinicius campos, pra falarmos sobre como nascem os livros. e isso é muito mais difícil de explicar a adultos do que organizar uma resposta, para crianças, sobre a origem dos bebês. e não é depois de escrever alguns livros que se sabe e se pode dar uma regra geral pra quem quer escrever um. cada um tem “seu” jeito, o que quer dizer seu método, processo, fontes, inclusive de inspiração e conexões para “chegar lá” e ver seu livro publicado.
mas levar o livro às estantes, abstratas ou concretas, é sempre a parte mais simples do problema. o danado é convencer leitores potenciais a investir mais do que dinheiro, seu tempo, precioso tempo que ninguém tem pra quase nada, pra ler mais de 400 páginas de um novos negócios inovadores de crescimento empreendedor no brasil, por exemplo, o livro que botei na rua em fins de 2013. porque você pode até escrever pra “se expressar”, comunicar o que sente para o mundo e ponto, não estar nem aí para leitores. mas, aí, seu livro não será livro, e sim segredo muito bem guardado. daqueles, talvez tão desinteressantes, que não haja nem um snowden pra libertá-lo para o mundo. o meu, escrevi para leitores, com a grande esperança de ajudar a mudar o estado da arte e prática de criatividade, inovação e, principalmente, empreendedorismo no brasil. tomara que, pelo menos para uns poucos leitores, parte da minha proposta encontre eco… e ação.
mas tergiverso. o resultado do trabalho de brenda está neste link e minhas respostas, na íntegra, às suas perguntas estão no texto a seguir. nem imagine que são regras gerais para escrever e publicar um livro. são poucas linhas, minhas, sobre o que eu acho que fiz. há muito mais a saber… e você, se for escrever, vai descobrir como…
Brenda Amaral: Literalmente, como nasceu seu primeiro livro? Depois de pensar em um tema, como foi a execução da ideia?
Silvio Meira: Havia uma chamada para autores nacionais para uma Escola de Computação, em 1986, em Campinas, e eu submeti uma proposta para um livro texto de graduação, com o título “Programação Funcional”, um dos três principais paradigmas de programação. A proposta foi aceita… vinha do tema da minha tese de doutoramento, que eu havia terminado no ano anterior, o tema estava fresco na minha cabeça… não vou dizer que foi só sentar e escrever, mas rascunhei a estrutura do livro e, literalmente, saí escrevendo. E entreguei dentro do prazo prometido, e exigido pelos editores, porque a Escola tinha data pra acontecer. Foi muito massa. Eu não sabia que era possível escrever um livro contra o tempo, até então…
BA: Demorou quanto tempo para finalizar o texto? Você tem algum método para escrever? Cumpre metas de escrever um determinado número de páginas por dia, só escreve durante um período do dia, em um mesmo lugar, etc?
SM: Eu acho que este primeiro livro não conta como “livro” mesmo… porque foi um dos efeitos colaterais de mais de três anos de trabalho na minha tese de doutorado, e era uma edição limitada. O que eu contaria como livro de “verdade”, para o grande público, e numa editora não acadêmica, é o meu último, NOVOS NEGÓCIOS NO BRASIL, que saiu pela Casa da Palavra. Este eu comecei a fazer a partir de uma palestra, que se tornou uma série de palestras, que por sua vez virou uma série de textos no meu blog (27, ao todo), que foram comentados por centenas de pessoas, em mais de um ano e meio da publicação da série. Aí eu me afastei a UFPE por cinco meses, fui para Harvard e trabalhei cerca de 1.000 horas definindo e redefinindo a estrutura, escrevendo, removendo e reescrevendo o material, lendo e relendo centenas de referências até que, um dia e depois de muitas reescritas, resolvi que o livro tinha “terminado”. Não que eu tinha terminado o livro, mas que ele estava “terminado”, por enquanto, pelo menos. Aí passei três meses sem nem abrir o material, que foi revisado por dezenas de pessoas, meus colegas, colaboradores e alunos, até que eu pegasse na coisa de novo, por mais tres meses e cerca de 5 horas de trabalho por dia, até que chegasse a um ponto em que eu e a editora concordássemos que sim, era hora de mandar imprimir. E assim foi…
BA: Depois de pronto, quem foi a primeira pessoa a ler o livro?
SM: Renato Lima, que faz PhD em Political Science no MIT. Até porque ele queria fazer uma entrevista comigo para o CAFÉ COLOMBO. Renato é amigo de longa data e suas perguntas e opiniões sempre me influenciaram.
BA: Sobre o contato com as editoras, como foi a sua experiência? Levou muitos nãos?
SM: Acho que tive muita sorte; ou então o rascunho do livro, que estava sendo publicado no meu blog, fazia sentido, pelo menos visto de longe; a Casa da Palavra topou publicar o livro nos meus termos, com liberdade de ação quase total, sem qualquer interferência no conteúdo ou estilo do texto. Tudo que está errado, lá no livro, é de responsabilidade exclusivamente minha…
BA: Qual a sensação quando o primeiro livro é aceito por alguma editora?
SM: Olha, no caso de NOVOS NEGÓCIOS NO BRASIL, foi muito legal saber que uma editora filiada a um grupo internacional [a Casa da Palavra é do Grupo LEYA, de Portugal] topava correr o risco de publicar um autor até então restrito ao meio acadêmico… foi massa. E eles correram um risco danado, porque o livro é grande [mais de 400 páginas] cheio de figuras [mais de 250] e referências [centenas…] e não foi escrito pra ser uma leitura simples, não; é uma reflexão sobre o que deveria ser o processo empreendedor no Brasil. Ainda bem que está vendendo legal, senão eu acho que iria ficar com um sentimento de culpa…
BA: Como você encara a escrita como profissão? Como treinar a mente para escrever bem, ter boas ideias, respeitar prazos, etc..?
SM: Não, não no meu caso. Escrever, pra mim, é parte do processo de entender o mundo, me explicar o que está acontecendo, criar sínteses sobre os assuntos e problemas que me interessam e me preparar pra intervir nele. É como se eu não tivesse um público, como se não escrevesse para ninguém, como se escrevesse, o tempo todo, para ter um registro do que penso -ou pensei- sobre algumas coisas. Eu acho -sempre achei- que a gente desenvolve linguagens, sua sintaxe [a forma], semântica [os significados] e pragmática [a prática, os usos práticos] para entender [no sentido de criar modelos de mundo], descrever [no sentido de explicar nosso ao redor] e intervir [no sentido de construir] o mundo. Por isso que eu escrevo. Às vezes eu escrevo só pra rabiscar uma ideia ou pensamento, pra ver se a coisa, escrita, faz tanto sentido quanto como pensada… porque uma não é, certamente, a outra, há uma perda -ou ganho- quando se sai da ideia para o texto. E aí, na maioria dos casos, eu deixo pra lá, jogo fora. Quando era em papel, era fora mesmo; agora, digital, eu só esqueço, me esqueço onde escrevi e como salvei. Eu não tenho prazos próprios, nunca tive. E não tenho nenhum processo pra treinar nada em relação à escrita. Sempre achei que a melhor “técnica” pra escrever qualquer coisa é um assunto, um tamanho e um prazo, tipo, sexta, 15h, tem que rolar um texto de até 4.000 caracteres sobre privacidade em redes sociais. E te vira, bróder, problema teu [ou meu, no caso!…]. Últimas horas operam milagres pra minha [cri]atividade, foco… dedicação, tudo. Afinal de contas, me comprometi e, do outro lado, alguém confiou que eu ia fazer… e tem que rolar.
pois é. e o que vai rolar ao redor do livro, agora no segundo semestre, é uma disciplina com vagas para alunos externos lá na FGV DIREITO RIO, durante 10 segundas feiras escolhidas entre 11/08 e 24/11, uma espécie de leitura e discussão, situada em casos reais, do livro inteiro, dirigida a pessoas de todas as formações que, cedo ou tarde, pensam em empreender algo. ou que querem só saber como seria, se fossem. os detalhes estão neste link. vá ver. todos são bem vindos.