pra começar a conversa, uma definição: a antiga indústria de telecom, que costumava ficar sob as asas das teles, se transformou, na última década e meia, no negócio de conectividade.
viver no mundo em rede significa viver conectado. eu e vocês nas nossas variadas redes sociais, nós e nossos bancos, nós e os serviços públicos, nós e as lojas, escolas, bibliotecas, usando a rede como infraestrutura. a rede, no sentido de internet, começa a deixar de ter papel colateral e passa a ser o centro da mais importante das economias correntes, a de trocas de informação e conhecimento.
lá no começo da internet no brasil, tomou-se uma decisão sábia: as empresas de telecom podiam fazer tudo, menos internet. a rede foi definida como um serviço de valor agregado e, como tal, estava fora do espaço regulatório “de telecomunicações”.
isso foi muito bom para dar uma partida criativa, inovadora e nacionalmente distribuída ao que veio, muito tempo depois, ser a internet.br. pra quem não tem idade ou memória, deve-se lembrar que uma das estatais da época tinha o pleito –e os meios- de querer ser o único provedor de acesso do país: queria ser a internetobrás. ainda bem que não rolou, senão estaríamos ainda mais atrasados do que estamos no que se trata de conectar o país.
muito bem: a internet se tornou [junto com água, esgoto, eletricidade, gás, rodovias…] uma das redes essenciais da economia e da sociedade. e falhas no provimento de serviços de internet, vasta maioria dos quais é hoje prestada pelas empresas de telecom, passaram a fazer parte do rol de problemas tratados pela ANATEL que, como todos sabem, vem a ser a agência reguladora do setor, assim como a ANP regula petróleo, gás natural e biocombustíveis e a ANEEL a energia elétrica.
quando se cria agências reguladoras, a idéia –em todos os países onde há uma separação e equilíbrio entre poderes- é deixar o processo político do setor a cargo do governo [no brasil, do minicom] e as coisas e causas do mercado e seu provimento a cargo da agência reguladora. isso deveria ser o caso por aqui, inclusive e talvez principalmente no assuno conectividade.
mas não é. parece que ainda não amadurecemos o suficiente para tal. não se trata só do executivo se metendo em assuntos de competência exclusiva do legislativo, como diz a procuradoria geral da república sobre o caso da TV digital, assunto recente deste blog. a imaturidade das relações entre as [muito] jovens instituições nacionais continua causando todo tipo de problema e constrangimento.
a mais recente tem a ver com o caso speedy, cujas falhas motivaram uma intervenção da ANATEL –para proteger os consumidores- no provimento do serviço da telefônica, no interesse do mercado e da própria empresa. agências reguladoras existem para isso, também: para proteger as empresas delas próprias.
todos sabem que a anatel proibiu a venda do speedy até que a telefônica regularizasse o provimento do serviço. feito isso, a telefônica fez um plano para estabilizar sua rede, anunciou publicamente suas ações nesta direção e, recentemente, anunciou que concluiu a execução da primeira etapa do plano. ao mesmo tempo, a empresa quer voltar a vender o serviço, seu direito líquido e certo, desde que cumpridas as exigências do órgão regulador.
aí é onde entra o ministro hélio costa, ultrapassando suas competências institucionais, para dizer que… O efeito da pena que foi imposta já foi sentido. Houve uma repercussão nacional, a empresa está consciente de que precisa modernizar e investir, melhorar o atendimento. certo, ministro. mas o senhor não precisa intervir nesta conversa. a anatel é uma agência independente, está lutando desesperadamente para ordenar a conectividade ao nosso redor e tal tipo de comentário só adiciona pressão –indevida- para que a agência faça o que –tendo a telefônica cumprindo suas exigências- já iria mesmo fazer: liberar a venda do speedy para usuários desta vez, tomara, satisfeitos.
o argumento ministerial de que… O castigo foi merecido, foi cumprido, mas não pode prejudicar o consumidor… como justificativa para a retomada imediata da venda do speedy não faz o menor sentido, porque há de se avaliar se as medidas impostas pelo regulador foram cumpridas, exatamente para proteger os atuais e novos usuários. e a ANATEL sabe, e não precisa de nenhuma pressão adicional, que tem que se pautar por equanimidade de tratamento para todos os lados: uma vez cumpridas suas determinações, a empresa não pode continuar tendo suas ações restringidas pela agência um dia sequer.
para o brasil, para o setor, para o equilíbrio entre a formulação da política nacional de conectividade e sua execução e regulação, é uma pena que o senhor ministro tenha perdido tamanha oportunidade de ficar calado. até porque a ANATEL, pelo que se sabe, vai tratar outros provedores que têm problemas muito parecidos com os do speedy. tomara que o próximo seja o meu…