este post é parte de uma série sobre educação empreendedora, derivado de uma palestra dada no sebrae nacional, em brasilia, no 27 de janeiro passado. pode até ser que você entenda o texto que se segue sem ler os posts anteriores; mas os textos foram escritos como se fossem uma palestra, uma conversa, o que significa que há uma sequência, começo meio e, espero, um fim, uma conclusão que faça sentido.
o primeiro post da série está neste link… passe por lá, até para entender o preâmbulo e contexto desta conversa.
nesta série, antes deste texto: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10; depois, nenhum, ainda. simbora.
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o problema que temos que discutir hoje é… será que nosso empreendedor é capaz de construir um produto competitivo que…
…e isso…
…ou seja, dois grandes problemas num só, tipo como se nosso candidato a construtor de negócios estivesse a ponto de criar algo como faceBook. não foi a primeira rede social, não é a mais inovadora, mas chegou e criou barreiras de entrada mesmo com gente no mercado. que o digam mySpace e, no brasil, orkut.
barreiras de entrada podem acontecer na forma de proteção à propriedade intelectual, usando patentes ou guardando segredos. a indústria [bio]química e farmacêutica faz muito uso da primeira estratégia para proteger suas descobertas, fórmulas e processos e a de software [como serviço, na maioria dos casos, vide google] usa o segredo como principal estratégia de proteção, apesar das aparentes guerras de patentes que vemos aqui e ali.
mas não é só: pode ser que você [e seu negócio] sejam parte de algo muito maior, como uma política industrial. isso ocorreria, por exemplo, se você fizesse parte da indústria chinesa de móveis de madeira, que passou de zero à esquerda na década de 80 para, entre 1997 e 2006, subir de 4% para 19% de participação no mercado mundial [segundo han, wen e kant neste artigo]. entre as barreiras de entrada que seu negócio herdou da política chinesa [se você estiver lá, claro] estão o câmbio e a legislação, entre muitos outros fatores.
mas, se você quisesse se diferenciar no meio da multidão de fornecedores chineses… o que você faria? apostaria em design? qualidade? parceria com a ikea ou wal-mart? em processos amplamente sustentáveis de produção e distribuição? todos ao mesmo tempo, provavelmente em maior ou menor intensidade em cada caso? sim, sim, tudo faz sentido. você teria energia e capacidade de investimento para tocar quantas destas vertentes ao mesmo tempo?… pois é. não é fácil, mesmo se você fosse parte da "indústria chinesa" que está literalmente dominando o mundo.
e você pode estar enfrentando desafios muito maiores, como ser [ou estar tentando ser] parte da indústria de software no brasil. deixando de lado todos os problemas de contexto [usualmente resumidos na expressão "custo brasil"] há uma coisa que você e seu time podem se perguntar sobre o problema que vai criar seu novo negócio: o que nós sabemos sobre isso? o que não sabemos? as barreiras que você há de criar são quase que certamente baseadas no que você sabe do seu produto, negócio e mercado, como um todo, e do bom uso que você puder fazer disso, no tempo certo.
do ponto de vista intrínseco do produto, quão bem você sabe e pode fazê-lo, frente às demandas dos consumidores em potencial? quer ver uma pergunta pela qual 90% dos meus alunos [mesmo de pós-graduação] não passa depois de ter seu projeto "pronto" para ir pro mercado?… esta: sua solução "escala"? ou seja, o que acontece com a performance de seu produto quando houver muitos, mas muitos usuários mesmo, o suficiente para seu produto criar um negócio rentável [pensando bem… o mínimo de usuários, não é?…] usando a coisa ao mesmo tempo?… rapidamente, na maioria dos casos, descobre-se que os engenheiros-de-software, potenciais candidatos-a-empreendedor continuavam na sala de aula e esqueceram considerações elementares como performance [e, usualmente, segurança] de suas aplicações.
em software, um novo e secreto algoritmo, de alta performance e segurança, é uma clara barreira de entrada de competidores no seu mercado. mas, se já houver gente à sua frente, você vai ter que convencer o mercado e o jogo não vai ser só performance e funcionalidade, por exemplo, mesmo que sua performance seja maior. você vai ter que levar em conta cultura, rede de vendas e treinamento, facilidade de uso… base instalada do adversário, parcerias [suas e dele]… capacidade de investimento [se a solução é software como serviço e sua base de hardware é própria]… e por aí vai.
se seu negócio é carne de "cabritos orgânicos", a cadeia de valor é outra, claro, e as barreiras de entrada que você tem que construir são outras. como ter melhor plantel de partida? e o processo mais sustentável, limpo e rápido de crescimento, engorda, abate e distribuição? e acordos de exclusividade com pontos de venda? em que termos? por quanto tempo?… se este é seu caso, procure saber noutra fonte, porque disso eu realmente não entendo nada.
mas você pode pegar uma longa e clássica lista de barreiras de entrada neste link, saindo de propaganda e chegando em integração vertical, passando por controle dos recursos [para fazer seu produto], leis e regras [como a reserva de mercado de informática no brasil de outrora], dumping [sim, arrasar a competição em potencial baixando os preços abaixo do custo… é ilegal mas tem gente que faz… muita gente], prática restritivas [como não deixar a azul voar de e para guarulhos ou congonhas…], criação de monopólios [como o da petrobrás…] e por aí vai.
na prática, em um novo negócio verdadeiramente inovador, você é que deveria estar à frente da competição e criando barreiras de entrada para competidores futuros. se eu fosse você, esqueceria o repertório mais clássico e eticamente duvidoso e me concentraria em entender e atender uma demanda de mercado que os provedores atuais não estão conseguindo dar conta, fazendo isso de uma forma que eles não conseguiriam, por mais que tentassem, mesmo que por muito tempo. se for o caso, no processo, você pode até criar um negócio que os que estão "à frente" tenham, como alternativa, comprar para resolver o problema deles de não conseguir competir com você. lembre-se: um dos melhores efeitos colaterais de se criar um negócio para construir um produto inovador e tornar seu próprio negócio um… produto, coisa que se negocia do mercado… quase como qualquer outro produto.
e tudo o que falamos no parágrafo anterior deve ser feito [no sentido de implementado] rápido, muito mais rápido do que a competição, sem que você esteja perseguindo a bola, mas intuindo e calculando onde ela vai estar no futuro e chegando lá antes dos seus competidores. esta última frase é devida a wayne gretzky, o maior jogador de hockey de todos os tempos, explicando sua performance no original em inglês: “I skate to where the puck is going to be, not where it has been.” e já que falamos de gretzky, enquanto você está tentando chegar no lugar onde a bola vai estar, vá pensando nessa outra frase: “You miss 100% of the shots you don’t take.”
criar barreiras de entrada depende de você imaginar o futuro, chegar lá antes dos outros e tentar. e errar, e tentar novamente. e aprender tentando e tentar de novo até descobrir o casamento entre o que você quer fazer, o que os outros estão fazendo, o que o mercado pode pagar pelo que você está fazendo ou vai fazer e como, e por quanto tempo, esta combinação de coisas pode ser mantida. e como evoluir daí pra frente, o tempo todo, como se seu negócio fosse uma bicicleta: parou, caiu.
porque barreiras de entrada não são estáticas. pense em mubarak: pode apostar como ele, depois de tanto tempo, tinha certeza de que as barreiras de entrada criadas há décadas… eram para sempre. dançou. pense nisso. e cuidado para não dançar também, principalmente bem no começo.
no próximo encontro desta série, vamos considerar o último desta sequência de problemas radicais que nosso candidato a empreendedor tem que enfrentar. se não houver gente à frente, no ramo de negócios… e ele vai ter que ser o primeiro a abrir um mercado… será que…
não saia daí. a gente volta dentro de um ou dois dias, com o próximo capítulo de nossa novela empreendedora… até lá.