este post é parte da série educação empreendedora, um conjunto de textos sobre criatividade, inovação empreendedorismo e negócios -no brasil- que estão [todos] referenciados neste link. boa leitura.
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toda vez que alguém me diz que seu negócio é focado em inovação e que sua empresa só pensa nisso eu fico ressabiado. porque começou a parecer com quem diz que é fascinado por tecnologia, e não com o valor [inclusive diversão] que ela pode agregar a seu trabalho e vidas. ligados ao [ou no] meio, parecem se esquecer dos fins.
inovação é um meio para se atingir diferenciação. drucker dizia que é a única fonte de vantagens competitivas sustentáveis. mas se inovação é fonte, dela sai algo, que há de ter um curso, um fluxo, movimentos, destino, um fim. o que queremos é diferenciação e isso depende, em boa parte, da execução –ou performance- do negócio. e de quem o faz.
na prática, no ciclo de vida dos negócios, é preciso combinar pelo menos duas culturas: a de performance e a de inovação. e isso não é fácil, porque elas fazem coisas diferentes e estão em diferentes quadrantes da vida corporativa.
tempos atrás, uma discussão sobre políticas e gestão da inovação me levou a refletir sobre sucessos e fracassos das empresas, inovadoras ou não, e a uma [re]leitura de textos sobre práticas de inovação. os slides para o debate estão neste link e, entre as fontes consideradas, vale a pena lembrar uma [Projects as communicating systems: Creating a culture of innovation and performance, de johannessen e olsen], discutida abaixo
os autores simplificam as culturas organizacionais em termos da relação entre duas vertentes, o grau de interação [entre as pessoas em um projeto ou organização] e o de coordenação [e controle, realizado pela organização sobre as pessoas e grupos], como mostrado no diagrama abaixo.
o grau de interação numa organização [ou projeto, numa] vai de pequeno [quase ninguém diz nada pra mais ninguém, por variadas razões] até grande, onde todo mundo fala com todo mundo sobre tudo. isso é um continuum e não uma separação binária, claro. o grau de coordenação vai de pequeno a grande, extremos que representam negócios [ou projetos] onde as pessoas são deixadas livres para se articular como quiserem [e puderem] e, na outra ponta, quando a organização administra o grupo em grande grau de detalhe.
no primeiro quadrante deste mapa, temos uma cultura contra producente: os agentes foram deixados livres para se articularem, mas não interagem. e aí nada –ou muito pouco- acontece. o resultado? muito provavelmente seu negócio está indo para o grande cemitério dos CNPJ. se for um projeto, provavelmente vai dar errado, e pode arrastar o negócio para o mesmo destino.pior é que pode levar muito tempo para as pessoas perceberem isso, pois a conversa, no grupo, é muito pouca.
no segundo quadrante, o resultado de pouca conversa e muita coordenação é uma cultura de comando e controle, que funciona muito bem para iniciativas onde não é necessário um grau de liberdade e criatividade no desenvolvimento do negócio. tipicamente, estamos falando de humanos executando ações repetitivas, dia e noite. coisa cada vez menos comum em qualquer cenário de negócios.
se há um alto grau de coordenação e, ao mesmo tempo, muita liberdade de expressão [que tem que ser usada, na prática, para "criar" este quadrante], temos uma cultura de performance. o efeito rede funciona, as "entregas" acontecem, os clientes estão satisfeitos e há resultados todo fim de mês. este é o quadrante que paga as contas; sem ele, lá vamos para o cemitério dos CNPJ de novo.
por fim, se o grau de coordenação é pequeno e o de interação e expressão alto, estão criadas as condições para uma cultura de inovação. muitas ideias vão circular, muita novidade vai aparecer, muita gente criativa se sentirá habilitada a propor mudanças… enfim, o negócio sempre estará pronto para mudar, até porque sempre haverá muita energia para tal.
aí aparece a pergunta, quase óbvia: que tipo de negócio queremos, numa economia como a atual, onde as coisas estão mudando na velocidade, largura e profundidade em que mudam?…
parece claro que uma cultura contra producente não é desejável. uma cultura de comando e controle pode ser interessante em certos cenários, mas este paradigma está sendo reconsiderado até nas forças armadas, que estão se reorganizado ao redor de princípios de formação e evolução de redes…
queremos, certamente, uma cultura de performance: entregas de qualidade, no preço e prazo, mantêm o negócio vivo, atendem clientes e pagam contas. mas o hoje bem feito não garante o amanhã. é por isso que, à performance de todo dia, é preciso aliar a construção, em beta perpétuo, de um amanhã que ainda não sabemos bem o que é e tampouco sabemos fazer direito [até porque o desconhecemos, pelo menos em parte]. o resultado é mostrado no diagrama abaixo, sumário do artigo de johannessen e olsen.
e você diria: como? pois é, grande problema. não há regra geral. há formas quase certeiras de falhar, como separar o pessoal que "cuida de inovação" da galera que entrega performance. o exemplo canônico é o PARC, o centro de inovação da xerox onde foi criada boa parte da computação pessoal das últimas décadas, sem que quase nada disso fosse capturado, como valor, pela empresa.
parece inevitável que inovação [e quem cuida dela] tem que estar espalhada por toda a empreitada, seja negócio ou projeto, com todo mundo pensando e agindo, ao mesmo tempo, em prol de um presente de entregas e um futuro de mudanças, ao tom da dinâmica do mercado [ou criando o tom de tal dinâmica]. os dois implicam em um alto grau de interação no negócio, o que talvez possa ser qualificado como uma "democracia" corporativa.
empresas como a w. l. gore têm mostrado como combinar performance e inovação por décadas, aliando times pequenos e mentores ao invés de chefes, gestão de longo prazo, tempo para as pessoas interagirem… e têm dado resultado. isso envolve toda a estrutura do negócio: para você ter uma idéia, a atual CEO [terri kelly, vídeo abaixo] foi "escolhida", em boa parte, numa "pesquisa aberta" entre os funcionários. você imaginaria isso em uma empresa americana, numa economia centrada em resultados?…