Nos mercados em rede, sua empresa é uma rede; dentro do negócio e fora dele. Para ser parte significativa de uma rede, seu negócio inteiro é centrado em execução, feita por pessoas, gente, colaboradores. A base de qualquer negócio é ter um grupo de colaboradores satisfeitos, sem o que será impossível ter clientes satisfeitos, porque não haverá como executar, sem colaboradores satisfeitos, um atendimento de excelência.
Um dos maiores problemas que um investidor enfrenta é descobrir empreendedores. Há muita gente com ideias por aí. Um povo que acha que sua genial concepção de um novo “qualquer-coisa” é suficiente para mudar o mundo e, por isso, fazer fortuna. E estes são o lado bom da força; pois há quem venha com uma conversa esquisita de que tem uma ideia para “ficar rico”: estes, via de regra, têm que ser descartados na hora, antes que façam algum mal maior à humanidade. Se conseguirem, não será com a colaboração de nenhum investidor minimamente responsável.
Quem empreende de fato resolve um ou mais problemas que um grupo de pessoas -quanto maior, melhor [e mais difícil] tem. Para fazer isso, o maior problema é óbvio: será que nosso candidato a empreendedor de sucesso consegue montar um time vencedor?
Como não deve ser difícil de imaginar, escolher as competências e pessoas certas para o time que vai criar um negócio não é trivial. Depois de dezenas de negócios que vi surgirem [e darem certo, e errado] no C.E.S.A.R, Porto Digital e na squared.ventures, passei a ter a certeza de que esta é a parte mais crítica de todo o negócio. Antes, durante e depois de seu processo de criação. O principal papel de um líder de um novo negócio é montar e liderar um time, sem que isso o torne o “dono” ou manda-chuva do empreendimento nascente. Um startup é um time; e um time é feito de trabalho e pessoas, um grupo coeso, resolvendo problemas relevantes. Como a galera da foto acima, que há 50 anos trouxe a Copa do Mundo para o Brasil.
De um certo ponto de vista [teórico], empreendedorismo é o conjunto de quês, porquês, “comos”, “quens”, “pra quês” e “pra quens” que leva à criação, descoberta, avaliação e exploração das oportunidades de realizar novos produtos e serviços. Mas, acima e além de tudo isso, empreender é liderar.
E liderar não é mandar, não é criar estruturas. Liderar é, cada vez mais, criar redes; redes de entendimento e propósito, de integridade e confiança, de determinação, dedicação e capacidade de execução.
E, em muitos casos, a tal “montagem do time vencedor” é negligenciada pelos jovens empreendedores a ponto de vermos, o tempo todo, times onde todas as competências, de todos os envolvidos na partida do negócio, são iguais. Ou pior: vez por outra são grupos em que a maior parte das conversas difíceis [“não, não é você que vai fazer isso porque você não é o cara para isso”…] foram evitadas… em nome da amizade e convivência..
Em negócios de tecnologia de informação, tipicamente, o grupo é um conjunto de nerds [amigos] que não faz ideia do que é mercado, clientes, usuários, formação de preços, investimento, e por aí vai. E olhe que não estou nem levando em conta se o time inicial tem alguém minimamente competente para gerir pessoas e seus conflitos, algo que não é incomum no processo de criação de negócios, dadas as condições e tensões dentro das quais todos vão viver por muito tempo.
O time vencedor, num novo negócio, é uma mistura equilibrada de todas as competências que são essenciais para dar partida no empreendimento. Claro que você não precisa começar com um CEO, um CTO, um CFO e um ou dois CLOs [não sabe nem o que é isso? veja aqui]… mas pense seriamente em ter no time alguém que vai liderar a construção da oferta do seu negócio, outro alguém que vai entender o mercado e trazer clientes e usuários e um[a] carinha que põe a mão na massa de forma radical e entende tudo do que está por trás da cadeia de valor da construção e entrega de seu produto ou serviço, se possível em escala global, pra tomar decisões sobre o que, como, com quem e onde fazer e saber explicar, sempre que necessário porque fazer do jeito que está sendo ou foi feito.
O “time vencedor” inicial não deve ter menos de duas pessoas. Não converso -quase nunca- com candidatos a empreendedor que me chegam sozinhos, e eu sou o primeiro cara com quem eles querem falar… sem nunca terem tido uma conversa comigo até então. Por que? Pense bem: se você acha que consegue montar um negócio da China [hoje, literalmente…] e não consegue convencer seus dois melhores amigos e [ou] colegas de trabalho [pelo menos um, em último caso] da sua proposição… por que você me convenceria ou, de outra forma, a qualquer outro analista, consultor, investidor, cliente ou consumidor?…
Negócios existem no mercado, mercados são conversações, conduzidas por vozes humanas. Converse, converse, e… depois que tiver conversado tudo o que tinha que conversar, converse o dobro disso, até ter alguma certeza de que sua proposta de negócios para em pé. Esqueça a ideia de que a ideia “é” o negócio. Pense quantos grupos tiveram a “mesma ideia” de Instagram… e quantos botaram a coisa no ar e valiam o que eles chegaram a valer [pra quem comprou]. Ao tempo que você tem uma ideia, montes de outros grupos estão tendo a mesma, igual ou quase. O que vai diferenciar um do outro é a capacidade de cada um montar um time vencedor. Ou a falta dela. O que montou, os que montaram, são amplas redes de conversações e alianças, muito pouco secretivos sobre o que são e estão fazendo, com raras exceções.
Pois o “time vencedor” é uma rede social, um conjunto de interações humanas que tem um processo de construção, evolução e manutenção próprios e onde você, que lidera o empreendimento, vai ter que tomar decisões complexas, como tirar alguém do time no meio do processo. Ou no começo, às vezes. Ao contrário do que pode parecer, trata-se de um evento muito comum que, quando não é tratado no devido tempo e com a firmeza e delicadeza exigidas, quase sempre põe todo o esforço a perder.
Já vi times muito bons se perderem porque um dos “sócios” resolveu que o papel dele era, digamos, observar o trabalho dos outros, talvez porque se achasse mais “sênior”… quando na verdade não passava de um menino. Pois é. Montar um “time vencedor” não é nada simples e, como se não bastasse, trata-se da principal atividade do negócio, para sempre. Mesmo que você tenha o tal time vencedor no começo, nada garante que, se ele não for devida e dedicadamente cultivado, incentivado, redesenhado, reeducado, reorientado, seu negócio ainda vai estar no ar, digamos, mil dias depois da partida.
Aqui no brasil, 22% das micro e pequenas empresas morrem antes de completar três anos de vida, segundo os últimos dados oficiais. Nos EUA, só 44% das empresas completa quatro anos; qual a porcentagem dos novos negócios brasileiros que completa quatro anos?… que percentagem está andando de banda, como caranguejo, aos quatro anos?
O “Instituto dataMeira” acha que menos de 25% das novas empresas continuam sendo um bom negócio depois de quatro anos. E que a taxa de fechamento de empresas no Brasil só é menor que nos EUA porque somos mais afeitos a baixas performances aqui e, como se não bastasse, é muito difícil fechar uma empresa no brasil. E tenho quase certeza de que, se a gente for olhar de perto, a causa mortis principal [excluídas as razões contextuais] é a inadequação do time para o negócio.
Resumindo: sua empresa, ou proposta de uma, tem que ser tratada como um time; um time coeso, feito de trabalho e pessoas, criando, descobrindo e resolvendo problemas. Nunca, jamais escolha seus parceiros e parceiras de aventura empreendedora [só] porque gosta delas. Se for assim, o negócio provavelmente vai dar errado e, no correr do tempo, você quase certamente destruirá seu círculo de amizades. A isso, é preferível ficar com os amigos, que são coisa preciosa, pra se guardar, e deixar este negócio de empresa prá lá…
O original deste texto foi publicada no TerraMagazine em fevereiro de 2011. Esta é uma versão modificada do original.