em tempos de grandes crises, o futuro, às vezes mais do que o presente, é o centro das preocupações das pessoas, famílias, grupos, empresas e países. covid-19 não causou nada diferente: nas empresas, ao mesmo tempo em que houve uma reação e mudanças conjunturais, imediatas e aceleradas, para sobreviver ao choque de abstração do espaço físico, a ansiedade sobre o futuro passou a ser visível, inclusive nos semblantes dos executivos. e dos funcionários, que deixaram de saber, mesmo nas melhores empresas, se seus empregos eram à prova de uma pandemia do porte da que vivemos.
quase todas as pesquisas realizadas no brasil e no mundo mostram o mesmo conjunto de fatores que complicam o cenários de negócios considerando business as usual, ao mesmo tempo em que aceleram mudanças que os líderes [até um dia desses, mas parece que foi há tanto tempo] ainda entendiam como futuros de médio ou longo prazo. o certo é que o processo de transformação digital dos mercados se acelerou e, para muitos, acelerou muito. pesquisa feita por twilio [covid-19 digital engagement report] em julho aponta 97% dos executivos relatando uma aceleração na transformação digital dos seus negócios e um salto de 6 anos [em média] na penetração de múltiplas facetas do “digital” em seus mercados…
…então… imagine que você foi dormir em 2020, acordou em 2025… e sua empresa, que não estava prestando atenção aos despertadores, continuou acordando em 2020.
estamos diante de um salto de inovação. e inovação é a mudança de comportamento de agentes, no mercado, como consumidores e fornecedores de qualquer coisa. e uma boa parte dos consumidores foi exposto a um novo universo de transações iniciadas no espaço digital, ou totalmente realizadas no espaço digital, e teve que -pelo menos por um tempo- mudar seu comportamento. e esta mudança pode ser permanente. um estudo de 2009 mostra que o tempo mediano para estabelecer um novo hábito é 66 dias [mínimo 18, máximo 254]. COVID19 fez muita gente testar e, errando, aprender novos hábitos por 90 … 150 dias ou mais. agora pense nas consequências disso para seu modelo de negócios e o que você terá que fazer para adaptá-lo à nova realidade dos mercados. até porque quando um hábito se estabelece, mesmo se o estímulo que levou as pessoas a adotá-lo seja eliminado -…o que não é o caso na mudança para costumes digitais…- o comportamento adquirido permanece por muito tempo, como mostra o estudo deste link sobre o consumo residencial de energia no brasil, na crise de oferta do começo dos anos 2000.
esse é o tema de uma pesquisa do ibm institute for business value, IBV, alguns resultados da qual são mostrados e discutidos a seguir. primeiro, uma clara maioria das organizações acelerou sua transformação digital… e dois terços delas conseguiram completar iniciativas de transformação que enfrentavam resistências no negócio.
transformação digital, quando acontece em pequena escala numa organização qualquer, causa [pelo menos] 5 efeitos…
- aumento da agilidade do negócio;
- aumento de eficiência do negócio;
- melhoria da experiência do consumidor;
- aumento de competitividade do negócio e…
- otimização do modelo de negócio.
mesmo quando o processo de transformação é periférico, e como ele é sempre cultural e impacta as arquiteturas de criação, entrega e captura de valor da organização e, por causa disso, as relações e estruturas de poder… a lista acima, bem realizada e devidadamente espalhada na organização, pode não ser uma tarefa muito simples. agora imagine uma transformação mais ampla e profunda, que causa…
- mudança radical da agilidade do negócio;
- mudança radical de eficiência do negócio;
- transformação da experiência do consumidor;
- transformação de competitividade do negócio e…
- transformação do modelo de negócio,
…e pense no tamanho da bronca que os líderes -às vezes, o lider-, numa organização legada e efetiva para o passado, têm que enfrentar e resolver para, por exemplo, transformar a competitividade do negócio. e uma transformação digital de verdade irá transformar o modelo de negócios da empresa… que pode sair do outro lado do processo com um sistema operacional totalmente diferente de quando entrou, com produtos, serviços, processos e governança totalmente diferentes lá do ponto de partida.
não é à toa que há oposição a processos de mudança nas organizações… e ela é feita, de forma [in]consciente, por pessoas de todos os níveis na empresa, de executivos e membros do conselho aos trabalhadores que executam as funções mais simples na organização. mas o tempo passa, e nada será como antes, amanhã.
esse gráfico dá a porcentagem dos pesquisados [3.450 executivos de 22 mercados em 20 países, de abril a junho de 2020] e suas prioridades há 2 anos, agora, e daqui a 2 anos. duas vezes mais executivos têm transformação digital como prioridade agora, em relação a 2018, dois terços esperam que seja prioridade em 2022. você pode até não achar, mas eu acho que -para uma pesquisa feita no meio da pandemia- MENOS de 40% dos líderes de negócios entenderem que transformação deveria ser prioridade… é suicídio para os outros mais de 40%.
e a razão é muito simples: não estamos vivendo uma adaptação ou evolução, mais; isso foi até COVID19. passamos a viver uma transição e, em muitos casos, uma ruptura, daquelas que ocorrem só poucas vezes na história dos negócios. rupturas acontecem quando novas tecnologias habilitam novos modelos de negócios assimétricos demais para os incumbentes, a ponto deles nem tentarem usá-las. os modelos de negócios emergentes evoluirão rapidamente, e aí, de repente… já é futuro.
modelos de negócios assimétricos são aqueles que migram valor entre mercados. no caso dos jornais, por exemplo, parte do processo de captura de valor migrou para o mercado de busca e redes sociais… e a vasta maioria dos jornais [a] nem conseguiu usar nenhuma das tecnologias que provocou a mudança, para recapturar parte do valor e [b] tampouco conseguiu mudar seus modelos de negócios para capturar outros valores, permanecendo travada na pirâmide de valor do passado… otimizando custos para sobreviver. é assim mesmo que as empresas vão, por moto próprio, para o grande cemitério dos cnpj.
a parte mais curiosa da definição de ruptura é o de repente…: são anos, e muitos, normalmente. volte para o caso dos jornais ou pense em ecommerce, e há quanto tempo existe, o que está se desenrolando agora e quanta gente que tem investimentos no passado [como lojas nos centros das cidades, onde não mora mais ninguém e pra onde, também, quase ninguém quer ir ou vai, mais…] ainda nega, peremptoriamente, um futuro cada vez mais digital naqueles mercados.
de qualquer maneira, parece que transformação digital está decolando e é muito provável que muitos incumbentes conseguirão fazer uma transição do físico para o figital. tomara.
mercados, empresas, times, pessoas [e cidades, países, governos…] estão na transição do físico [ou analógico] para uma articulação [feita por todos] do FÍsico, habilitado, aumentado e estendido pelo diGITal, orquestrados no espaco sociAL, em tempo [quase] real. FIGITAL: parece que não há muita dúvida de que este é o invariante dos novos normais.
nesta transição, as empresas têm que fazer reflexões profundas sobre seus modelos de negócios. um modelo de negócios é [parcialmente] o conjunto de respostas à pergunta… quem paga o que, para quem, para fazer o quê para quem, quando, onde, como e por quê?… e dinamicamente, em tempo real.
em condições normais de temperatura e pressão, para qualquer novo ou antigo negócio, as respostas a estas perguntas podem estar certas, erradas, indefinidas ou mudando. nas transições, as respostas estão quase sempre erradas, indefinidas ou mudando… sem falar que as perguntas são difusas, incompletas e emergem do contexto ao redor.
o que deveria levar todo o negócio -ou seja, todas as pessoas, no negócio…- a uma busca determinada, consequente, de uma grande estratégia para a [grande, quase sempre] transição. mas a pesquisa do IBV é só mais uma que mostra uma grande dissonância entre o que os executivos acham que estão fazendo para levar as pessoas, na organização, para o futuro, e o que as pessoas efetivamente percebem que está acontecendo.
não vou nem transformar a imagem em palavras, seriam milhares. tire suas próprias conclusões. aí é onde vai dar problema. transformação digital não se compra, se faz. ocorre no negócio. é uma mudança cultural, nas pessoas, nos grupos de pessoas, na empresa como um todo. empresas são abstrações. o que importa são as pessoas. são as pessoas que se transformam. ou não, e nada ou muito pouco acontece. e, para passar por uma transição, muito tem que acontecer.
escrevi quase 100 páginas [em GENTE, DIGITAL, neste link] sobre diagramas como o mostrado acima e porque e como agir para transformar não a percepção, mas a realidade que transforma a percepção… e lá eu digo que…
Organizações contemporâneas estão competindo pelo único recurso que realmente importa: pessoas. Gente qualificada para resolver problemas, no mercado e na competição entre empresas. Em verdade, um pouco mais do que isso: competem por pessoas capazes de identificar e criar novos problemas nos quais os negócios vão competir. É preciso capturar o problema para o negócio e trazer, junto com ele, um universo de empresas e outras organizações e suas competências. E isso tem implicações não triviais, que nos levarão a competir por qualificação e diversidade, nossas bases futuras para entender o mercado e competir, nele ou noutro.
mas o tempo passa, pouca gente aprende, e ainda há gente comprando pura e simples tecnologia e pensando que está adquirindo transformação, que se instala no negócio. ouvi isso tantas vezes nos últimos anos que nem contei, depois da centésima. se eu fosse você e tivesse dúvida, iria ler o tal do GENTE, DIGITAL, neste link. boa leitura…