nas defesas da sociedade, o direito à privacidade

esta semana, no blog, já falamos de espionagem e privacidade [em comunicação, privacidade e os ajudantes do diabo], ao comentar o projeto do governo inglês de gastar cinqüenta bilhões de reais pra gravar e processar todas as transações informacionais do reino unido, à guisa de "combater o terror". vá lá ver o texto; é de assustar qualquer um.

também nesta semana, um grupo de cientistas americanos, reunidos no national research council de lá, entidade que é parte da national academies of science, tornou público um longo e detalhado relatório, onde diz queAll U.S. agencies with counterterrorism programs that collect or "mine" personal data — such as phone, medical, and travel records or Web sites visited — should be required to systematically evaluate the programs’ effectiveness, lawfulness, and impacts on privacy… todas as agências que coletam e mineram dados pessoais deveriam avaliar seus programas sistematicamente para descobrir se são efetivos, legais e quais são seus impactos sobre a privacidade dos cidadãos.

segundo william perry, professor da stanford university e coordenador do estudo, "The danger of terror attacks on the U.S. is real and serious, and we should use the information technologies at our disposal to combat this threat… However, the threat does not justify government activities that violate the law, or fundamental changes in the level of privacy protection to which Americans are entitled." ou seja: a ameaça terrorista é real, séria e as tecnologias de informação podem ajudar a combatê-la… mas tal ameaça não justifica ações governamentais que violem a lei ou provoquem mudanças fundamentais no nível de privacidade dos americanos.

o relatório completo [Protecting Individual Privacy in the Struggle Against Terrorists: A Framework for Assessment] tem 376 páginas e vale a pena ser disseminado, estudado e discutido no brasil. nosso "terrorismo" é a corrupção; se nos estados unidos há quem ache que vale qualquer coisa em nome do combate ao terror, aqui há gente demais achando que qualquer preço é barato na luta contra a corrupção. não, não é. um dos preços, lá e aqui, tem sido achar que há suspeitos demais e sair atrás de "todo mundo". no brasil, há um número [em termos policiais] incerto e não sabido de pessoas sob escuta telefônica. nos eua, alguma coisa entre quatrocentos mil e um milhão de pessoas na lista anti-terrorismo. gente demais, dados demais, pistas demais, respostas de menos. o relatório mostra que os resultados de tal "esforço" são pífios, para dizer o mínimo. ou seja, invade-se a vida das pessoas pra… nada de objetivo, a não ser expor sua vida aos olhos dos curiosos.

aqui e lá, o país é regido por uma constituição, que estabelece direitos individuais bem claros, assim como limites estritos para a ação dos poderes constituídos. deixar que estes direitos e limites sejam diluídos em nome de uma "luta" qualquer é suicidar o futuro das pessoas, da sociedade, do país.

uma das principais defesas da sociedade é justamente o direito à privacidade. revoluções inteiras têm sido feitas por sua causa. e talvez seja bom lembrar que regimes totalitários têm, como habitual primeiro ato, a suspensão dos direitos e garantias individuais, começando pela privacidade.

o relatório dos cientistas americanos é muito claro: The United States is a strong nation for many reasons, not the least of which is its commitment to the rule of law, civil liberties, and respect for diversity. Especially in times of challenge, it is important that this commitment remain strong and unwavering. New technological circumstances may necessitate an update of existing privacy laws and policy, but privacy and surveillance law already includes means of dealing with national security matters as well as criminal law investigations. As new technologies become more commonly used, these means will inevitably require extension and updating, but greater government access to private information does not trump the commitment to the bedrock civil liberties of the nation. em resumo? mesmo em tempos difíceis e de conflito, cumpra-se a lei e respeitem-se a diversidade e as liberdades civis. e lembremo-nos de que uma das principais defesas da sociedade é, justamente, nosso direito à privacidade.

 

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