na mitologia popular brasileira, o juiz de futebol deve ser o deus do roubo, portanto padroeiro de uma larga porcentagem dos políticos. ao mesmo tempo, e principalmente se seu time perde -quer seja culpa dele ou não, a honestidade da ascendência materna do árbitro é seriamente questionável. coisas do futebol. pro bem, dizem uns: afinal de contas, se o juiz fosse mesmo justo, haveria pouco o que discutir depois da partida, que talvez se tornasse previsível e “certinha” demais.
mas o que dizer do “segundo” gol da inglaterra contra a alemanha? a bola entra mais de 30 centímetros, juiz e bandeirinha ignoram o fato e fica por isso mesmo. como se não bastasse, com uma câmera dentro do gol?…
sua senhoria tem rádio e há um quarto juiz fora do campo; em lances como aquele, não custaria nada parar a partida por alguns segundos e conferir o que aconteceu de verdade. afinal de contas, assume-se que o juiz está em campo para garantir que as regras do jogo serão obedecidas com toda a “justiça” possível. este, aliás, é um dos mottos do futebol, propalado aos quatro ventos pela própria FIFA: fair play, acima de todos os outros significados, quer dizer jogo justo, decente, honesto. falando nisso, o goleiro da alemanha viu que foi gol; mas não é o papel dele [mesmo com o tal do fair play…] denunciar ao juiz um gol do adversário. afinal de contas, se o juiz não “acha” que foi gol, não foi gol. e ponto final.
mas sua senhoria não tem toda a informação de que precisa para tomar suas decisões. o juiz não é onipresente [para isso, não por acaso, há bandeirinhas], tampouco onisciente… e vive num mundo de assimetria de informação, em tempo real, bola rolando, pressão por todo lado, bilhões de olhos observando e muitos mais bilhões de dólares em jogo. e isso faz toda diferença, do ponto de vista de usar [ou não] auxílio de tecnologia de informação para tomar decisões em campo… porque aqui fora todos nós vimos, segundos após o acontecido, que o gol inglês foi mesmo gol e que o tevez estava impedido, na banheira mesmo, como você vê na imagem abaixo.
e o público não chegou a tais conclusões usando supercomputação, bolas com chips, sensores nas traves ou na rede, câmeras robôs, nada disso; tudo o que usamos era muito, muito simples e disponível, fora do campo e com autorização da FIFA, para os espectadores: as câmeras de TV, daquelas normais, que estão às centenas dentro do campo.
querer esconder do juiz a informação que todos nós temos aqui fora é tirar boa parte do fair play do futebol e fingir que o mundo não está mudando. será que a tecnologia da jabulani, a bola maluca desta copa, é igual a das bolas de capotão dos anos 60? será que a tecnologia que construiu e permitiu 200 mil pessoas no maracanã de 1950 é a mesma de hoje? que tal ler o caderno de encargos da FIFA, que despachou o morumbi, para comparar?…
mais de meio século de evolução nos deu a jabulani [por bem ou por mal], estádios muito mais confortáveis e seguros, ingressos negociados pela internet, cobertura global do futebol em 3D e em todos os detalhes e, ao mesmo tempo, trata-se a assimetria de informação do juiz como se vivêssemos na década de 50, ouvindo os jogos pelo rádio de ondas curtas. não estamos mais, e é isso que a FIFA teima em não entender. e de nada adianta pedir desculpas, como fez sepp blatter, ao méxico e à inglaterra, pois isso não muda o resultado dos jogos.
na década de 50 e talvez até a década de 90, o juiz, mesmo com todos os problemas de tratamento de informação, tinha mais dados do que a torcida, à exceção de um ou outro espectador privilegiado [e este, só em alguns lances]. hoje, e em muitos casos, a audiência tem muito mais informação do que o juiz. como a audiência se transformou em comunidade, ativa, na rede, conectada e relacionada, a verdade fica do lado de fora das quatro linhas do gramado. lá dentro, prevalece a hipocrisia que quem simplesmente não quer usar os meios que já estão disponíveis [como um simples e eficaz replay] no controle remoto da TV lá de casa.
é a FIFA brincando de avestruz e deixando o fair play fora do jogo.