um post de fim de ano, com 15 parágrafos, cada um representando uma das 15 tendências que já eram evidentes em 2015 [e antes…] e que podem se consolidar em 2016 e depois, com impactos importantes e relevantes para as pessoas, instituições, organizações, economia e sociedade. falta muita coisa aí, em especial mercados em rede, que não é mais uma tendência, mas uma certeza, e sobre os quais eu estou precisando escrever há um bom tempo. como o que eu tenho a dizer sobre eles era muito mais longo do que um parágrafo, fica pro primeiro post do ano que vem. por enquanto… lá vão as 15 pra 16..
1:
a web se tornará cada vez mais fragmentada, face a legislações nacionais exigindo serviços locais. se cada país determinar que serviços de rede só podem ser providos, em sua jurisdição territorial, por negócios que tenham estruturas locais de armazenamento e processamento de dados, os mercados nacionais serão fechados, de fato, a serviços externos. à exceção dos já dominantes, que têm meios de engenharia e financeiros para criar e manter um grande número de sites globais. um bom número de serviços interessantes e relevantes, mas usando por poucos, ou que teriam pouco retorno sobre investimento para localização deixarão de existir em certas geografias.
2:
teremos mais conflitos tecno-legais, como o caso recente do bloqueio dos serviços de whatsapp pela justiça demonstrou. as disputas entre empresas globais -e que gostariam de estar sujeitos a uma regulação global, ou àquela do país a partir do qual prestam seus serviços- e sistemas jurídicos locais, diferentes daqueles onde estão as sedes e núcleos de tecnologia dos negócios, aumentarão a complicação de operar em certos países, como o brasil, e levarão alguns serviços a desistir de operar em países onde não seja confortável fazê-lo. enquanto isso, não há sinais de que um bom número de países consiga chegar, nem tão cedo, a um acordo para uma ordem global sobre a internet; continuaremos mergulhados no que einstein chamava de sarampo da humanidade.
3:
startups terão mais dificuldade de entrar nos mercados globais, como consequência direta das duas tendências acima. por outro lado, é possível que surja um mercado, em países como o brasil, de copystarts, como é o caso da china e rússia: países de grande porte e população, com um grande número de usuários em potencial e uma infraestrutura de rede razoável, assim como renda média considerável… com legislação objetivamente contrária a serviços de fora e órgãos de regulação e controle devidamente aparelhados para fazer valer a lei. se o brasil fosse a china ou rússia, a ordem para filtrar whatsapp teria sido cumprida pelo comitê gestor da internet brasil, o CGI.br que, sabiamente, se pronunciou CONTRA o bloqueio ao whatsapp.
4:
junte as 3 tendências acima com as capacidades [ou falta delas] de desenvolvimento tecnológico, de inovação e investimento das mais variadas geografias e pense nas consequências para países como o brasil. é provável que haja, aqui, uma rede de segunda classe, com serviços que são bons para o brasil, mas que não conseguem sair daqui e competir no mundo. isso por conta do isolamento que venha a ser provocado pelo grau de complicação de prestar serviços no brasil, combinado com nossas incapacidades de desenvolvimento de negócios de classe global. pra entender qual seria o impacto disso na sua vida, descubra, agora, quantos aplicativos brasileiros você usa quase todo dia [tirante bancos e que tais]. sobrou o que?…
5:
estamos quase prontos para ver o deslanchar, de uma vez por todas, da internet das coisas. depois de quatro décadas seguidas de revoluções digitais que deram conta de cada uma das fundações -70’s, hardware; 80’s, software; 90’s, redes e 00’s, móvel- a década atual é onde estamos estabelecendo as fundações -os principais componentes, os formatos, os protocolos- para que as coisas -físicas- sejam informatizadas, todas e cada uma. dentro de pouco tempo será impensável que qualquer coisa -seja ela qual for- não tenha alguma capacidade de computação e comunicação embutidas e não consiga ser controlada -e controlar outras coisas- de longe. quase cada dispositivo terá sensores muitos e atuadores vários, capazes de encantar, ao nosso redor, uma inteligência ambiental que nos ajude a realizar, com muito menos esforço, nossas tarefas.
6:
um caso particular de ambiente inteligente ou, pelo menos, esperto, são as smart cities, cidades em que um grande número de ações -e reações, da cidade e das pessoas- ocorre levando em conta exatamente as coisas, em rede, a prover uma quantidade muito grande de informação -grande demais, até- em tempo real. estamos falando de informação de tráfego, de anomalias como enchentes e picos de poluição do ar ou baixa humidade, de concentração de pessoas, de luzes e postes capazes de capturar e enviar informação sobre suas vizinhanças, de sinais de trânsito conectados, em rede com outros, iguais, e com veículos de socorro e emergência. as cidades inteligentes podem ser o locus do cidadão inteligente. isso vai começar a pegar agora. só que, no brasil, ainda vai demorar um pouco mais, porque a bagunça aqui ainda é grande demais e cidades -inteligentes ou não- dependem de governo, que por sua vez dependem de política que… bem… é melhor deixar pra lá.
7:
internet das coisas e cidades -e prédios, e fábrica e casas- inteligentes vão ser os principais responsáveis pelas montanhas de dados que vamos ver no futuro próximo. enquanto nós, humanos, seremos no máximo 4 bilhões de conectados à rede até o fim da década, estima-se que 2016 verá 6.4 bilhões de coisas na rede, 30% a mais que em 2015, e a caminho de 20.8 bilhões de coisas conectadas em 2020. boa parte destas “coisas” vai gerar dados continuamente, para todos os tipos de organizações e usos. big data vai assumir proporções impensáveis há um tempo atrás. compare um contador de energia analógico [uma captura de dados por mês, no máximo] a um smart meter digital [muitas capturas por hora, talvez 1/min] e pense no volume de informação que terá que ser tratado -e protegido- pelas empresas. big data, como qualquer outra vantagem criada pela tecnologia, traz, junto, um monte de problemas.
8:
drones e robôs chegaram para ficar. o drone que você vê por aí não passa de um aeromodelo de última geração, totalmente controlado por um piloto -você, talvez- que toma todas as decisões. mas os drones que estão chegando agora voam de forma autônoma, podem realizar tarefas algo sofisticadas, e voam em bando, como pássaros. já os robôs, quem não ouviu falar de carros sem motorista? houve um tempo em que só GOOGLE faria um, no curto prazo; agora, quase todos os fabricantes têm algum tipo de iniciativa, com TESLA prometendo os seus, nas ruas, em 2018. o problema é: que ruas? na califórnia, onde estão tesla e google, os carros autônomos terão que ter motorista. os problemas -para carros, drones e robôs autônomos- vão de ética até segurança, passando por confiança, nossa, neles. apesar de tudo, partes significativas da “autonomia” dos carros sem motorista está chegando nos carros normais, na forma de vários tipos de auxílio ao motorista.
9:
parte do que robôs podem fazer fora da repetição ad infinitum de tarefas muito simples depende de inteligência artificial, dirigir um carro depende de alguma inteligência, coisa que pelo menos parte dos motoristas finge não ter. um sistema tem inteligência artificial se seu comportamento é avaliado, por humanos, como inteligente -como similar, ou igual, ao nosso, em certos contextos. IA -inteligência artificial- é outra revolução digital quase madura e pronta para ser usada, em larga escala, agora. o tratamento de big data depende em parte de IA. as aplicações de IA vão de games a pilotos automáticos, passando por automação industrial, sistemas de diagnóstico e cirúrgicos e educação. e mais quase tudo o que você pensar que pode ser feito por uma pessoa inteligente. só pra você saber, já faz uma década que IAs especializadas em jogar xadrex não perdem para nenhum grande mestre humano. enquanto IA assume funções simples, do ponto de vista de “inteligência”, aqui e agora, há gente muito relevante preocupada, a sério, com o futuro da humanidade versus a evolução de IA: será que estamos criando uma tecnologia que poderia, primeiro, nos dominar, nos tornar irrelevantes e, por fim, decidir nos exterminar?…
10:
por causa de quase todas as tendências acima e da nossa dependência, crescente e estrutural, de dados, informação e conhecimento digital para fazer quase tudo, estamos passando a viver num mundo em que a insegurança de informação será a norma e não exceção. o número de vulnerabilidades em sistemas de informação cresceu pelo menos uma ordem de magnitude nos últimos dez anos, o número de incidentes associados a hackers aumentou exponencialmente no mesmo período e sequestros de dados, em tráfego ou em arquivos e bases de dados se tornou quase endêmico. a verdade é que sistemas de informação -mesmo os corporativos, dos bancos inclusive- não são projetados e programados pensando em segurança em primeiro lugar, mas pondo funcionalidade em primeiro plano. como resultado, e como a prioridade dos malfeitores digitais é insegurança, o atual estado da arte da segurança de informação digital é pró-crime. e vai continuar assim, por muito tempo…
11:
teremos menos, e não mais, privacidade. não só por causa da tendência anterior, que tem um efeito aqui, como mostra o caso de ashley madison. mas porque privacidade -como entendemos hoje- é uma criação contemporânea, do século XX pra cá. na antiga roma, não só os banheiros eram comunais, mas os sanitários, neles, também. até o séc XVI, as casas não tinham paredes internas. apesar de haver muitas razões para se pensar -e se agir como- a privacidade fosse um direito universal, consolidado em cartas magnas em todo o mundo, há cada vez mais sinais de que tudo -do bem estar pessoal à busca de evidências criminais, passando pela facilidade da navegação na web- pode ser um bom argumento para diminuir a privacidade dos cidadãos, de forma incremental, mas ao mesmo tempo determinada e inexorável.
12:
a vida, literalmente, começa a ser cada vez mais digital. não a vida pessoal, de trocas de informação e dos negócios e instituições ao nosso redor. mas a vida, mesmo, essa que a gente vive. sem muito medo de errar, pode-se dizer que computação [clássica, associada a sistemas de informação] são algoritmos, programados sobre bases físico-químicas. a vida, por outro lado, como a minha e a sua, são algoritmos, programados sobre bases bio-físico-químicas. as possibilidades são imensas. a capacidade de processamento de informação genética avança a velocidade mais rápida do que a prevista pela lei de moore para eletrônica digital e já dá pra ver quais serão os primeiros efeitos de [re]programação digital de sistemas vivos usando técnicas como CRISPR-CAS9 e seus sucessores. além de comecar a tratar muitas doenças e síndromes na raiz, editando os bugs do código que as causa, estamos chegando bem perto de criar novas formas de vida, “do zero”, com todas as implicações humanas, éticas e morais [e econômicas?…] que virão como consequência.
pra terminar, três previsões “leves”, mas que terão efeitos dramáticos no curto prazo, para os envolvidos.
13:
o digital fará mais séries, vídeos e filmes. e ganhará mais prêmios. breve, veremos um OSCAR pra amazon, que já ganhou o EMMY e o GOLDEN GLOBE. a “virada” das plataformas de mídia para o digital vai continuar pela década afora, como mostra o investimento da GLOBO no seu “play”. aliás, a globo, que havia apostado todas as suas fichas num padrão de TV digital que habilitava o móvel fora das operadoras, parece ter deixado o SBTDVD [sistema brasileiro de TV digital] prá lá, depois que entendeu que a ida dos espectadores pra rede -não como audiência, ou público, mas comunidade- é inevitável. e mais rápida do que parecia, há alguns anos.
14:
independentemente disso, franquias como STAR WARS continuarão fazendo bilhões. em pouco mais de uma semana, por sinal. uma história instigante, bem contada, que parece uma que bilhões de pessoas talvez queressem viver, de luta e glória em defesa de um ideal [?]… no futuro, com mistérios de todos os tipos a resolver, cenários de outros mundos a explorar, como [quase] era o caso do senhor dos anéis e harry potter. star wars ensina, de novo, que um super épico, muito bem feito, fará multidões saírem de casa, enfrentar filas gigantes e curtir a experiência e o formato que os irmãos lumière inventaram há 120 anos. quantas das nossas tecnologias -de hoje- vão durar 120 anos? será que youTube, pra citar algo similar, chega na metade? sei não.
15:
cada vez mais, tudo é software. até propago uma hashtag quando falo disso, #tudoÉsoftware. entre os debates que há por aí, hoje, um que está conectado à tendência anterior é… “será que, depois do F35 americano, haverá outro avião de caça pilotado”? as cenas de combate aéreo que aparecem em star wars, envolvendo naves inimigas, são do tempo da guerra do vietnam. desde o início dos anos 90, todos os caças abatidos no planeta jamais viram o avião [ou míssil] que os abateu. nos últimos anos, software, no avião [8 milhões de linhas de código, no F35] e fora deles [centenas de milhões de linhas noutros sistemas, aéreos e em terra] tomou conta da maior parte das ações de combate [e de vôo civil] e há muito pouco -na verdade- para um piloto fazer numa cabine. por outro lado, há menos ainda para um piloto, num avião de combate pré-software, fazer contra um F35. impossível competir. como é [quase?] impossível competir com google nos negócios dele, hoje: sabia que o que começou como uma máquina de busca e dezenas de milhares de linhas de código, há 17 anos, tem hoje, rodando, 2 bilhões de linhas? pense nisso, toda vez que alguém lhe disser que “vai competir com google”. e, se ninguém vai [hoje?], o que é que alguém [que iria, ou irá] deveria fazer para competir? se lembre do que disse bill gates, sobre tamanho do código…
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feliz ano novo. e que o brasil lhes seja leve…