os trabalhadores americanos têm cerca de dez dias de férias por ano depois de um ano no emprego e quinze dias por ano depois de cinco anos no mesmo trampo. um em cada três americanos não usufrui de suas férias integralmente e menos de dez por cento tira férias contínuas, gastando todo o seu tempo de uma vez. isso faz da américa um dos países em que mais se trabalha no planeta e os resultados são visíveis, na economia, nas empresas… e no stress das pessoas.
a netflix, concorrente virtual da blockbuster, resolveu mudar a cena e adota, há algum tempo, a política de férias quando você quiser, desde que seu trabalho esteja [bem] feito. é só olhar um anúncio de postos de trabalho… our vacation policy for salaried employees is “take some” – there is no limit on vacation as long you get your work done… e está lá, escrito em letras normais, tire tantas férias quanto você quiser.
qual é o lance, mesmo? por mais incrível que pareça, é tão claro quanto parece. você faz seu trabalho [não há “ponto”] e pronto. além de competência, a empresa espera que você tenha compromisso, espírito de equipe, capacidade de julgamento e de inovação, tenha coragem e seja honesto, se dedique à causa e a seus colegas que tentam, com você, realizá-la e, acima de tudo, que você tenha paixão. senão, nem entra. e dentro, se perder algum destes valores, tá fora, sem choro nem vela.
parece um lugar ideal de trabalho. qual é a mágica que mantém tudo funcionando? a pressão de seus colegas. o time, como um todo. a sensação de que todos fazem parte do mesmo processo, realizam a mesma missão, atendem os mesmos clientes e usuários e, tal como entre os para-quedistas, cada um tem que amarrar o para-quedas muito bem, para todos, pois nem sempre se pula com o “seu” para-quedas.
a netflix espera, com tal política, que as pessoas tirem, em média, 25 a 30 dias de férias por ano. o que daria mais ou menos no mesmo do que ocorre em lugares onde as relações trabalhistas são ultra-reguladas, como no brasil. com uma diferença fundamental: na netflix, as pessoas tiram as férias porque querem e porque acham que seu trabalho, na empresa, vai continuar a existir enquanto elas estiverem de férias e depois. aqui, em pindorama, a tutela exercida pelo estado sobre as relações de trabalho não só proíbe quase toda e qualquer inovação mas, ao mesmo tempo, incute em nossas mentes que trabalho e férias são direitos humanos fundamentais.
e são mesmo, para todos os que rezarem por cartilhas de princípios pessoais como os que a netflix exige de seus colaboradores. na era do conhecimento, quando a força física é cada vez menos necesária ao trabalho e às empresas, o trabalhador não precisa bater ponto pra entrar ou sair do trabalho. porque ele não desliga seu cérebro e nem apaga, de lá, os problemas que está tentando resolver [no e para o trabalho]. o trabalhador do conhecimento é always on. sem ponto, sempre ligado. e de férias quando quiser e bem entender.
a netflix e outras empresas podem estar prototipando, para o mundo, um novo ambiente e forma de trabalho, onde a fluidez e flexibilidade dos modos de trabalho e descanso são articuladas pelo nível do compromisso das pessoas com a empresa e pelo grau de realização pessoal e empresarial. como se fôssemos todos sócios. e sócio, como se sabe, não bate ponto. nem tira férias. ou melhor, tira férias quando bem quer, desde que seu trabalho esteja bem feito e não se precise dele nos próximos dias.