parte do congresso americano, sob pressão de organizações como MPAA e RIAA, representantes dos interesses dos "grandes" e antigos negócios do entretenimento [leia cinema e "discos"], gostaria muito de passar leis com os que atendem pelas sopas de letrinhas SOPA, ou stop internet piracy act [veja detalhes em vídeo, em espanhol, aqui] e PIPA, para protect intelectual property act, que para efeitos práticos é equivalente a SOPA. o último tramita na câmara e o primeiro no senado americano.
a "indústria" de [plataformas de suporte ao] entretenimento representada pela dupla MPAA e RIAA depende de leis de propriedade intelectual pré-internet e pretende estender seus direitos de posse e exploração até o fim dos tempos. é um setor muito bem articulado da economia americana [a ponto do presidente da MPAA ser um senador, que fala explicitamente de "apoio" de hollywood a políticos…] e tem conseguido operar milagres, como a "lei mickey mouse", aprovada em 1998 quase que para evitar que o mickey caísse no domínio público cinco anos depois.
pelas leis de 1790, primeiras a tratar do assunto nos EUA, obras artísticas e literárias eram protegidas por 14 anos após a morte do autor, mais uma renovação pelo mesmo prazo. no limite, as obras caíam no domínio público 28 anos após a morte do autor. com a lei mickey mouse, a proteção dos direitos é a vida do autor mais 70 anos, no máximo 120 anos se for uma criação corporativa. e 20 anos de proteção adicional para o que havia sido feito antes de 1978, caso de "steamboat willie", onde primeiro apareceu o mickey, que deveria ter se tornado domínio público [pela legislação de cada época] em 1956, depois em 1984, 2003 e agora, se nada mudar, em 2023. um grande "se". o aumento da proteção é mostrado na imagem abaixo; clicar leva à explicação de cada uma das faixas.
a inspiração para SOPA e PIPA não é a mesma da lei mickey mouse, mas vem da mesma fonte: proteger negócios já estabelecidos contra a inovação. primeiro, vamos estabelecer que, no regime democrático [ideal?], com todas as instituições funcionando, há leis a cumprir, sob penas conhecidas. mas regimes se estabelecem em função de interesses. e o "ideal" do governo do povo, pelo povo, para o povo, com que abraham lincoln fechou o discurso de gettysburg em 1863, parece ter sido substituído por valores, princípios e interesses bem menos merecedores de figurar em discursos históricos. e, certas horas, "o povo" tem que lutar para mudar leis, quando não regimes inteiros, como nas ditaduras. os mais jovens não viveram esta experiência, mas já fizemos isso no brasil, para acabar com uma ditadura que durou 21 anos.
outras horas, há que se lutar para evitar a edição de leis contra o interesse "do povo", quando os que estão no poder "pelo povo" têm uma ideia muito diferente do que fazer "para o povo"… do que o "povo" quer fazer ou já está fazendo. SOPA e PIPA levam a tal conflito [assim como o "nosso" próprio ai5 digital] não só porque defendem interesses de indústrias ameaçadas de extinção por uma inovação em larga escala –a internet, usada por mais de dois bilhões de pessoas em todo mundo- e seus efeitos colaterais em todos os tipos negócios. em última análise, aprovada a combinação das duas propostas, qualquer site [como a wikiPedia] poderia ser retirado do ar in totum se qualquer um de seus artigos fosse, de forma deliberada ou não, cópia de material cuja propriedade pudesse ser reclamada por um terceiro. numa rede social como faceBook, então, as penalidades impostas pelo que poderiam vir a ser as novas regras tornariam impossível manter o serviço "no ar". o impacto das leis, se aprovadas, é muito maior do que a defesa pura e simples dos direitos autorais, trata-se de uma intervenção radical nos mecanismos de funcionamento da própria rede.
a ideia central de SOPA, PIPA e do AI5 digital [proposto pelo deputado azeredo, veja mais sobre o tema aqui] é velha, é de que há um editor, que um centro controla as bordas, o que elas publicam ou fazem. como consequência, o "editor" deveria responder por "tudo" o que acontece no seu "meio", como se todos que o usam fossem controlados por ele, como é o caso dos jornais, rádio e televisão. dantanho, claro, pois ninguém pauta, cria ou "controla" o que "vai ao ar", ou melhor, à rede, no youTube, twitter ou faceBook ou wordpress. a não ser quem antigamente era "audiência" e, hoje, é comunidade. posso subir o vídeo de um caldo que alguém levou na praia, com péssima qualidade de gravação e nenhuma edição [mas alto potencial de entretenimento] ou uma cópia de "steamboat willie", o filme de 1928 que tem a proteção de que falamos, caso em que posso ser processado [e não youTube] por infringir a lei que tem o nome do rato.
semana passada, como forma de protesto, um grande número de sites que poderiam ser afetados por estas leis resolveu protestar, com a wikipedia em inglês "saindo do ar"por 24h e mostrando apenas a página abaixo.
o movimento se tornou mundial e, antes da manifestação popular que afetou toda a internet [gerando mais de 4.500 tweets por minuto], as propostas de lei podiam ser explicadas pelo infográfico abaixo. agora, o lado de lá está se reorganizando. e vai voltar à carga, pois o que se conseguiu até aqui foi parar o trator, mas não impedir –de uma vez por todas- a demolição das bases sobre as quais usamos a rede. isso ainda vai nos dar muito trabalho, tanto global como localmente. vamos continuar a discussão no próximo texto desta série. até lá, entenda as propostas de lei com o remix de quino e mafalda, pelo menos enquanto não tiram o derechoaleer.org do ar…