O futuro vem do futuro. isso quer dizer que você cria um cenário do que você quer que seja o futuro e convence um bocado de gente a ir pra lá com você e, aí, o futuro se torna presente. ou há quem convença você que o futuro deles pode ser o seu, e você vai junto. e há o caso em que você nem tá sabendo do que pode vir a acontecer e, de repente [só pra você!…] o futuro aparece, como mágica. mas não é. futuros dão um trabalho danado pra acontecer, especialmente os futuros que têm inovação [quase sempre sustentada por tecnologia] como parte de seu processo de construção. e um futuro qualquer pode levar tanto tempo pra acontecer que quem fica falando e propondo que ele pode ser dado é quase sempre tratado, por muito tempo, como mentiroso.
quer ver? imagine que você ouvisse alguém dizer que –algum dia- todas as pessoas do planeta estariam conectadas e teriam acesso a dados e programas em qualquer computador, a partir de qualquer lugar. em 1962. pois foi isso que j.c.r. licklider, no MIT, e em 1962, escreveu, definindo o conceito de intergalactic network, que veio a ser a base para o que, tempos depois [em 1969!], começou a ser a arpanet, o princípio para o que hoje todos conhecem como a internet. o resto é história. mas do conceito fundamental para a internet comercial foram mais de 30 anos! por isso que inventar o futuro é difícil: ele teima em ficar lá, no futuro.
que futuros você imaginaria, hoje? tá cheio de gente imaginando coisas, pelas mais diversas razões. quando as imaginações passam por mercados, a isca pode ser um gráfico como o mostrado abaixo…
…do número de carros, daqui até 2025 [600 milhões, lá] com o que o se rotula de telemática embutida [leia capacidade de captura e processamento de informação, talvez associada a atuação e controle, tudo isso conectado a sistemas externos aos veículos]. e olhe o brasil na foto, bem grande, com mais de 50 milhões de veículos conectados. e você perguntaria… quem imaginou este futuro? a GSMA, associação que representa interesses de mais de 800 operadoras no mundo inteiro. e por que? porque o mercado de conexão pessoal, em 2025, estará completamente saturado, como todo mundo conectado e com um smartphone banda [muito] larga na mão. e daí? daí que, se ninguém fizer nada, teremos um cenário estável, de nenhuma ou pouca mudança, com a possibilidade de crescimento restrita a fusões, aquisições ou canibalização, e nenhum deles corresponde exatamente a um oceano azul.
aí é onde entra a associação do setor, pensando –e agindo– para criar o futuro. aí é onde o brasil aparece na fita, como parte da hipótese de trabalho do grupo, de que
…em algum tempo futuro, todos os carros precisarão ser conectados ao mundo exterior através de uma rede celular. a forma mais segura e amigável [em relação ao usuário] de habilitar tal conexão é embutir um módulo de comunicação e um cartão SIM no carro. feito isso, o mercado automotivo irá convergir, no longo prazo e de forma natural, para soluções de telemática embarcada, a menos que barreiras muito grandes impeçam tal desenvolvimento.
note que o cenário embutido na hipótese da GSMA é conectar carros ao mundo via uma rede celular e que a melhor forma de fazer isso é ter módulos de comunicação e cartão SIM no carro. óbvio. se isso acontecer e se os modelos de negócio para tal forem minimamente parecidos como os das conexões pessoais, seu carro estará na rede mais ou menos como você e… você terá mais uma conta de dados a pagar! por isso que a GSMA está no lance, trabalhando para que tal futuro aconteça, pra você [seu bolso, claro] e pra ela [as operadoras…]. e, claro, há razões pra comemorar: se tal futuro rolar, seu carro será mais rastreável [o que pode diminuir o prêmio dos seguros], a fábrica do seu carro pode acompanhá-lo de perto [o que pode melhorar a qualidade dos serviços, especialmente de manutenção preventiva], capaz de ser criado um mercado de apps para carros [e motos, barcos, etc.] que podem agregar um monte de funcionalidades que as fábricas não têm tempo e foco para fazer… e por aí vai. e lá se vão bilhões de dólares por ano para o caixa das operadoras…
mas o que interessa, agora, é construir o cenário para o futuro. definir os padrões. começar a criar regras [leia legislação…], discutir os possíveis mercados, impactos positivos [muitos] e negativos [quais?…] da coisa toda e, principalmente, tratar de convencer a maior quantidade possível de atores relevantes de que este futuro, o da telemática embutida nos carros, é inevitável e que, mais cedo ou mais tarde, os agentes todos irão para lá, com óbvias desvantagens para quem chegar atrasado. a figura a seguir dá uma ideia das classes de aplicações que se imagina demandadas, no tempo, e por quem, e como tais demandas podem evoluir.
em mais de detalhe [de outra fonte, publicado depois do estudo da GSMA], olhe só o que se prevê que possam ser as aplicações nos carros… onde você vai ver um monte de coisas que já temos hoje em apps nos smartphones, mas que muita gente quer ver direto no painel do carro, conectado diretamente com todo o carro.
o documento de que falamos [GSMA 2025 Every Car Connected: Forecasting the Growth and Opportunity, aqui] é competente e interessante. e mostra, também, porque países que precisam dar saltos, como o nosso, não dão: não se imaginam imaginando, primeiro, o salto, convencendo outros a partir para o salto e, à frente de todos, dar o exemplo e o salto, em si. o resultado?… nós acabamos seguindo, de longe, o salto dos primeiros, com um gostinho triste e ruim de que poderíamos ter sido não só os primeiros mas, entre eles, poderíamos dominar [ou ter participação global relevante] no mercado criado pelos tais saltos para o futuro.