este post é mais um intervalo técnico para a série sobre educação empreendedora aqui do blog. antes deste texto, já foram publicados os "capítulos" 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15,16, 17, 18, 19, 20; depois, nenhum, ainda. simbora.
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[aviso aos navegantes: este texto é uma revisão de um outro, publicado neste link pelo autor em 2007; como o assunto está diretamente ligado ao texto de ontem aqui do blog, aqui vai a conversa, levemente reescrita.]
em 2005, a booz, allen & hamilton fez uma pesquisa pra descobrir o que os gastos em inovação das mil empresas que mais investem em pesquisa e desenvolvimento tinham a ver com seus resultados. a resposta, pouco surpreendente, é… nada. em suma, segundo um artigo de Nikos Mourkogiannis… …They found no significant correlation with any measures of corporate success. None. Not profits, not revenues, not growth or shareholder returns. In other words, the simple decision to invest in innovation is not enough. How you invest, and especially how innovation serves a larger purpose, determines the value of your investment.
derramar recursos em pesquisa e desenvolvimento, ou "ciência e tecnologia", como se costuma dizer na periferia, seja no âmbito das empresas ou de países ou estados, resulta em… nada. ou muito pouco. e em muito pouca geração e agregação de valor.
ampliando o foco, o brasil e gosta de comemorar o maior número de papers publicados, quase todos pelas universidades, onde residem nove entre cada 10 pesquisadores, como se paper fosse resultado. a aumentada relevância internacional da produção científica brasileira tem muito pouca importância na vida real dos negócios e na melhoria de sua competitividade. ao invés de festejar mais papers, talvez desse muito mais resultado planejar e induzir agendas de inovação, destinadas a mudar comportamento de produtores e consumidores de tecnologia, processos, produtos e modelos de negócio, no mercado, com ou sem papers e títulos acadêmicos a sustentá-los.
o gráfico abaixo mostra onde estamos hoje, investindo tanto quanto a rússia, como porcentagem do PIB, mas com menos de 1/5 dos pesquisadores per capita deles. também investimos tanto quanto itália e espanha. não é pouco dinheiro não. olhe onde estão china e índia, os outros dois BRICs. a china já é o segundo maior investidor global. e observe israel, taiwan e coréia do sul: nestes tres, as agendas de investimento em pesquisa e desenvolvimento são bem mais direcionadas por esforços de inovação, com os resultados que conhecemos no mercado mundial, inclusive aqui.
é claro que ninguém pode nem está a desmerecer o papel dos mecanismos de geração de conhecimento para o avanço da humanidade, direcionados pela necessidade individual e coletiva de saber mais sobre tudo ao nosso redor. mas -desde sempre- os recursos para se fazer qualquer coisa são limitados, ainda mais por aqui e, em tempos de ajuste de contas, em qualquer lugar. mourkogiannis, por essa e outras razões, é ferrenho defensor da busca do propósito no esforço de inovação, o que deveria ser feito no topo dos espaços mentais [conversações… veja o autor tem a dizer sobre o assunto aqui] classicamente considerados na inovação.
inovação envolve pelo menos três entendimentos: das tecnologias [e processos, métodos…], dos consumidores [existentes ou potenciais] e da competição [idem]. mas combinar tecnologias inovadoras, descobrir universos de consumidores e enfrentar a competição pode resultar em… nada. se não houver propósito. masaru ibuka, ao fundar a Sony, tinha idéias muito claras sobre o propósito de seu futuro negócio: “…to establish a place of work where engineers can feel the joy of technological innovation, be aware of their mission to society and work to their heart’s content”. o propósito da sony, claro, é a descoberta… o que fez a companhia ter ganhos reais de 10%a.a. entre 1967 e 1999.
segundo mourkogiannis, os propósitos podem ser classificados em quatro categorias: descoberta [como na sony], altruísmo [como no wal-mart, preços baixos para todos], excelência [berkshire hathaway, de warren buffet, desde o princípio comprometido a construir a melhor rede de investimentos do planeta] e heroísmo [dos primórdios da ford, cujo propósito era democratizar o acesso ao automóvel].
ter propósito não significa, por si só, maior possibilidade de obter resultados. propósitos individuais ou parcialmente compartilhados pela comunidade que se busca atingir [sua empresa, seus sócios fundadores ou, no caso de políticas públicas, todos os parceiros em todos os setores] pode inclusive aumentar a chance de fracasso de práticas [nas empresas] e políticas [no setor público] de inovação. o ponto de partida de qualquer processo, proposta ou política de inovação é combinar, com tantos quantos forem os possíveis atores, o que se quer atingir e fazê-lo de forma dinâmica, interativa e continuada. pois o mundo muda e muda muito rápido.
falando de propósito e de políticas de inovação no setor público, é preciso, quase que necessariamente combinar as quatro vertentes de mourkogiannis: o planejador [público] de inovação pública tem que estar dotado dos propósitos de heroísmo [para mudar o mundo ao seu redor], altruísmo [para estar pensando no bem comum], excelência [para fazer nada menos do que o melhor para sua comunidade] e descoberta [para promover verdadeiros avanços nas empresas e entidades sob seu cuidado]. sem descuidar, claro, de nenhum dos quadrantes da figura abaixo… discutida neste link.
por isso que o trabalho e difícil, pra não dizer quase impossível, pois tudo isso é para se ter e ser feito ao mesmo tempo. principalmente em lugares que estão quase sempre perdendo as janelas da história como o brasil. no meu entender, é algo que só pode ser feito por alguém que se divirta, de maneira fundamental, com as dificuldades do encargo e que esteja [e seja] desprovido de qualquer tipo de preconceito contra quem ou o que quer que seja. o mesmo, por sinal, vale para quem quiser viver pensando em inovação nas empresas.
noutra hora, discutiremos como propósito pode ser uma alavanca essencial para seu negócio, startup ou vida pessoal fazer sentido e ter uma chance bem maior de sucesso. o que não tem nada a ver, por sinal, com fluxo de caixa e outras medidas cartesianas usadas nos negócios "comuns", que não inovam… e que –por isso mesmo- não vão sobreviver.
[para ler o paper de nikos mourkogiannis na íntegra, pegue o .pdf aqui.]