vez por outra me perguntam quanto tempo eu “passo na internet”. no começo, há uns quinze anos, a pergunta ainda fazia sentido; afinal de contas, em 1995 eu só tinha internet, e daquelas muito lentas, na minha sala no CIN/UFPE. para a vasta maioria da população, internet era mais uma curiosidade. pra mim, era trabalho e, como o trabalho não ia para casa, pois as máquinas do trabalho –e mesmo a parca conexão de lá- eram inviáveis em casa [nem pensar no celular, então]… quando eu queria entrar na internet o jeito era ir para o local de trabalho. e cansei de passar sábados, domingos e noites muitas na internet, “lá no trabalho”.
foram bons tempos, aqueles; mas saudade zero, deles. como diz piero tonin no cartoon ao lado, o inferno foi tão bem pensado e construído que a internet, lá, é garantidamente lenta. além de, claro, só existir no local de trabalho…
a última das perguntas de gabriel dudziak, também o fim da nossa série de textos [depois de um, dois, tres, quatro, cinco conversas resultantes da mesma entrevista], é a versão contemporânea da pergunta original sobre o tempo que passamos na rede: Como você vê o fato de hoje termos que ficar conectados e informados praticamente 24 horas por dia? A tecnologia que era para ajudar o ser humano a se libertar de afazeres e serviços repetitivos está aprisionando-o?
minha resposta é…
Só fazemos mais do que fazíamos antes (os que fazem, e não são todos) porque queremos fazer mais. Somos agentes livres, dentro de um ambiente em que cooperamos e competimos para sobreviver.
Este "sobreviver" é que dá o nome ao problema; muitas vezes queremos "sobreviver" num apartamento maior, com um carro melhor, viajando mais, para lugares mais caros, tomando vinhos cada vez mais sofisticados, e nunca nos perguntamos se o esforço que realizamos para tal vale a pena. Perdemos um pouco, ou quem sabe, muito, do nosso ser para o ter, que na maioria das vezes nem nosso é, é das comunidades de que fazemos parte.
Como a rede deslocaliza e dessincroniza as ferramentas e meios de trabalho, numa sociedade em que quase todos somos criadores e manipuladores de informação, a oportunidade de "fazer mais" está sempre ao nosso lado. E vai estar cada vez mais, à medida que nosso padrão de conectividade se torne móvel, de boa qualidade e baixo custo, nesta década.
Vai ser difícil não trabalhar o tempo todo. Os que conseguirem ter tempo para outras coisas, desligados de suas conexões, talvez aproveitem uma outra vida, assim, "meio desligada".
Não significa que viverão menos, mais, ou melhor. Pouco importa; no fundo, somos e seremos todos diferentes e é isso que queremos: o direito, para todo o sempre, de sê-lo.